Agro brasileiro pode se beneficiar dos conflitos geopolíticos mundiais
Guerras, rivalidades entre potências e a agenda verde devem impactar e trazer vantagens à produção rural
A nova geopolítica mundial, marcada por guerras, rivalidades entre potências e a agenda verde, está impactando o agronegócio brasileiro em diferentes frentes.
Para discutir os desafios e oportunidades nesse cenário, o Insper Agro Global reuniu especialistas nesta terça-feira (14) em um evento sobre os impactos da geopolítica no setor.
Estados Unidos x China
O primeiro bloco do evento abordou as possíveis consequências de uma reeleição de Donald Trump nos Estados Unidos e a situação da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Caio Carvalho, presidente da ABAG, destacou o enfraquecimento da OMC pela retirada dos árbitros americanos durante o governo Trump, dificultando a resolução de conflitos e a aprovação de consensos.
“Claro que um órgão de resolução de conflitos não funcionando naturalmente torna-se difícil. Porém, a OMC depende essencialmente de aprovação coletiva nas reuniões ministeriais, buscando sempre um consenso. No entanto, isso não é possível hoje em dia, com tantos conflitos e diferenças, principalmente entre Estados Unidos e China.”
Christopher Garman, diretor das Américas do Eurasia Group, alertou para o potencial protecionismo e a postura beligerante de Trump em relação à China, com o aumento de tarifas, revogação do status comercial bilateral e restrições de investimentos. No entanto, ele pondera que o Brasil pode se beneficiar dessa situação.
“As repercussões de uma possível vitória de Trump nos Estados Unidos são profundas, especialmente em termos de política interna americana. Se olharmos para os assessores ao redor do ex-presidente, eles propõem aumentar as tarifas sobre produtos chineses em quase 60%, revogar o status comercial da relação bilateral entre países e impor mais restrições de investimentos na China. No entanto, o Brasil pode se beneficiar ao aumentar sua entrada no mercado chinês, especialmente diante de uma possível guerra comercial entre os países”
Segundo o Mapa, a China é o principal destino das exportações do agronegócio brasileiro, absorvendo seis dos dez produtos mais exportados: soja em grãos, carne bovina in natura, carne de frango in natura, celulose, açúcar de cana em bruto e algodão. O evento destacou a preocupação com o crescente protecionismo, especialmente de grandes potências como os Estados Unidos.
União Europeia
O segundo bloco do evento focou na política do Green Deal da União Europeia, que visa tornar a economia do bloco mais sustentável e combater as mudanças climáticas.
As recentes medidas, como a redução do uso de pesticidas e fertilizantes, a exigência de 25% de cultivo de orgânicos e a conversão de 4% das terras para preservação, geraram protestos de agricultores europeus.
“Nas últimas semanas, os agricultores protestaram contra os altos custos de insumos, combustíveis e energia, em um contexto de perda de renda e regras ambientais inflexíveis de Bruxelas. Com a pressão do Green Deal e a União Europeia indicando que não comprará determinados produtos devido ao desflorestamento, ela corre o risco de ter dificuldades de importação, o que pode afetar a segurança alimentar”, disse Caio Carvalho.
Christopher observou um aumento do protecionismo global guiado pela segurança nacional e pelas políticas verdes. Apesar de criar um cenário de conflito, isso pode gerar mais oportunidades para o Brasil.
“Isso cria um mundo do qual todos sofrem em nível global, inclusive o Brasil em certa medida. No entanto, pode trazer alguns ganhos táticos com desvios de comércio que essa guerra comercial pode gerar.”
O papel do Brasil
O debate no Insper Agro Global evidenciou a necessidade de o Brasil acompanhar de perto as mudanças geopolíticas e seus impactos no agronegócio.
A busca por novos mercados, a diversificação de parceiros comerciais e a adaptação às demandas por práticas mais sustentáveis são medidas essenciais para que o setor continue competitivo no cenário global em constante transformação.
Marcos Jank, coordenador do Insper Agro Global, salientou a importância de o Brasil se posicionar com inteligência nesse novo cenário geopolítico, ponderando as relações com os Estados Unidos e a China, seus principais parceiros comerciais.
“A gente pode ser chamado a optar por um lado ou por outro em um processo de polarização, e isso é uma questão que precisa ser muito bem pensada. O nosso agronegócio tem muita semelhança com o agronegócio americano, de onde aprendemos muito do que fazemos hoje, mas o nosso cliente principal está na Ásia, principalmente na China.”