74 milhões de hectares em propriedades rurais: como o Brasil pode explorar o potencial dos serviços ambientais

A entrevista com Britaldo Soares Filho, fundador do CSR/UFMG, revela detalhes sobre o pagamento por serviços ambientais e os desafios da implementação do Código Florestal no Brasil.

O Brasil possui aproximadamente 74 milhões de hectares de vegetação nativa em propriedades rurais que aguardam o pagamento por serviços ambientais. Esse dado foi revelado no terceiro Panorama do Código Florestal, um estudo realizado pelo Centro de Sensoriamento Remoto (CSR) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A pesquisa aponta que essas áreas excedem as exigências do Código Florestal e podem gerar recursos financeiros para os proprietários rurais, incentivando a preservação ambiental enquanto agregam valor à produção agrícola.

Excedente Ambiental: O Que Isso Significa?

Britaldo Soares Filho, fundador do CSR/UFMG, explicou que o conceito de “excedente ambiental” se refere a propriedades rurais que possuem mais vegetação nativa do que o exigido pela legislação, configurando um serviço ambiental. Esse excedente, presente em diversas regiões brasileiras, poderia ser remunerado por meio de mecanismos de pagamento por serviços ambientais (PSA).

“A prática mostra que os produtores estão cumprindo mais do que o estipulado pelo Código Florestal, e isso é um ponto positivo para o meio ambiente e a economia rural”, afirmou Britaldo Soares Filho. No entanto, o especialista alertou que a implementação do PSA e a valorização do serviço ambiental dependem de medidas mais efetivas, tanto públicas quanto privadas, para concretizar a remuneração das áreas preservadas.

Desafios para Viabilizar os Pagamentos

Um dos principais desafios apontados pelo estudo e por Britaldo é a validação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), um requisito necessário para o acesso aos benefícios do Código Florestal. A validação do CAR é essencial para certificar que as propriedades estão dentro da conformidade com a legislação. Segundo o pesquisador, a baixa taxa de validação, com apenas 1,8 milhão de cadastros validados até hoje, dificulta a implementação de políticas públicas e privadas de compensação ambiental.

Potencial das Áreas Preservadas e os Caminhos para a Recuperação Ambiental

Entre as áreas com maior potencial de pagamento por serviços ambientais, o Cerrado se destaca. Com uma exigência de apenas 20% de reserva legal em relação ao tamanho da propriedade, o Cerrado apresenta um grande número de propriedades com vegetação nativa além da exigência legal. No entanto, áreas degradadas também demandam atenção. O estudo revela que o Brasil possui 21 milhões de hectares degradados que necessitam de recuperação para atender aos requisitos do Código Florestal.

A recuperação dessas áreas é fundamental para garantir a manutenção da biodiversidade, a regulação das chuvas e o aumento da produtividade agrícola. O especialista sugeriu que o uso de incentivos econômicos é essencial para viabilizar projetos de recuperação, especialmente nas regiões mais degradadas.

A Revisão do Código Florestal e os Desafios de Regularização

Outro ponto crucial abordado por Britaldo foi a revisão do Código Florestal de 2012, que estabeleceu uma anistia para desmatamentos ocorridos até 2008. Para aqueles que desmataram antes dessa data, é necessário regularizar a situação do imóvel por meio do Programa de Regularização Ambiental (PRA). Isso implica na recuperação de passivos ambientais, com prazos de até 20 anos para a restauração das áreas degradadas.

Apesar das facilidades proporcionadas pela revisão, o grande gargalo continua sendo a validação do CAR. Sem uma validação eficiente e ampla, o cumprimento das metas do Código Florestal ficará comprometido.

Caminhos para Avançar

É fundamental que os programas ligados ao CAR e ao PSA sejam implementados de forma eficaz, com uso de novas tecnologias, como inteligência artificial, para acelerar a validação dos cadastros. Somente com uma atuação coordenada entre o setor público, privado e acadêmico será possível garantir a eficácia do Código Florestal e permitir que as propriedades rurais se beneficiem dos pagamentos por serviços ambientais, ao mesmo tempo em que preservam e recuperam suas áreas nativas.