Cientistas visam transformar vinhaça em hidrogênio verde
Insumo é útil na produção de fertilizantes sustentáveis e até como combustível
Pesquisadores vinculados ao Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI) trabalham no desenvolvimento de uma tecnologia que visa transformar a vinhaça – resíduo poluente gerado durante a produção de etanol – em hidrogênio verde.
De acordo com o jornal da Fapesp, atualmente, ao ser processada, a vinhaça costuma ser utilizada como adubo na fertirrigação de lavouras, sobretudo da cana-de-açúcar, por ser rica em potássio.
“Transportar esse resíduo até as plantações é um processo caro e trabalhoso para as usinas. Sem contar que, se mal aplicada, a vinhaça pode danificar a plantação e o solo, além de atingir os lençóis freáticos. É possível aprimorar esse processo”, diz Thiago Lopes, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP) e integrante do RCGI, um Centro de Pesquisa em Engenharia financiado pela Fapesp e pela Shell do Brasil.
À frente do novo Laboratório de Células a Combustível, situado na Poli-USP, Lopes pretende desenvolver um reator eletrolítico voltado para a realidade da indústria sucroalcooleira nacional.
“A vinhaça tem 95% de água em sua composição. A ideia é que por meio desse reator possamos quebrar as moléculas de água para gerar oxigênio e hidrogênio verde”, diz o pesquisador.
Com ampla aplicação, o hidrogênio verde pode ser utilizado, por exemplo, na produção da amônia que entra na composição de fertilizantes. “Hoje a amônia é sintetizada com hidrogênio proveniente de gás natural, o que gera uma pegada de CO2”, conta.
Já o oxigênio puro pode ser utilizado para a combustão do bagaço da cana-de-açúcar. “Ao condensar a água, pode-se obter de forma fácil e econômica um CO2 puro para estocagem ou então para ser convertido em produtos.”
Um deles é o ácido oxálico, elemento que junto a um biomonômero vai entrar na composição do hidrogel que está sendo desenvolvido no âmbito do Programa de Hidrogel, financiado pela Shell Brasil, com recursos da Cláusula de Investimento em P&D dos Contratos de Concessão da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
O projeto envolve várias instituições de pesquisa da USP, sob a liderança do RCGI, bem como da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
No caso, o ácido oxálico será produzido pelo Laboratório de Células a Combustível, em colaboração com o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).
O hidrogel gerado ao final de todo o processo de pesquisa será aplicado no processo de plantio em formato de grânulos, que vão se degradar e liberar o carbono para ser armazenado no solo. “A ideia é criar um ciclo virtuoso e habilitar novos mercados para o setor sucroalcooleiro nacional.”
Outra vantagem do reator é fazer com que a vinhaça fique mais concentrada – a cada litro de etanol são produzidos aproximadamente 10 litros de vinhaça. “É um volume gigantesco para armazenar e transportar. Se estiver mais concentrada, livre de uma fração de água, a vinhaça vai ocupar menos espaço e demandar menos transporte. Vale dizer que esse transporte, em geral, é feito por caminhões movidos a óleo diesel, e isso adiciona pegadas de CO2 ao etanol brasileiro”, aponta Lopes.
Segundo o pesquisador, a vinhaça concentrada também minimizaria a adição de adubo sintético à lavoura. “A mistura de vinhaça e adubo sintético provoca maior emissão de CO2. Sem contar que, ao reduzir o volume de água, evitamos que o excesso de líquido chegue ao lençol freático e polua os rios”, diz.
O hidrogênio verde também pode alimentar veículos com célula a combustível, uma das modalidades de veículos totalmente elétricos que hoje circulam pelo mundo, sobretudo no Japão. A outra modalidade são os veículos elétricos movidos a bateria recarregável em tomadas especiais. (com informações do Jornal da Fapesp)