Governo do Mato Grosso retira incentivos fiscais de empresas que restringem a produção em área desmatadas legalmente
Aprovada no início de outubro, a Lei Estadual 226/2022, sancionada pelo governador Mauro Mendes, retira incentivos fiscais de empresas que aderem à moratória da soja. Advogados apontam impactos na cadeia produtiva e possíveis reações das empresas.
O setor agropecuário do Mato Grosso foi surpreendido com a sanção do Projeto de Lei 226/2022, que retira incentivos fiscais de empresas que aderem a acordos comerciais que impõem restrições ambientais mais rígidas que a legislação nacional, como a moratória da soja. O anúncio foi feito pelo governador Mauro Mendes durante uma entrevista, e a lei começa a valer assim que for publicada no Diário Oficial.
Aprovado pela Assembleia Legislativa no início de outubro, o projeto, de autoria do deputado estadual Gilberto Catani, impede que empresas interessadas em benefícios fiscais ou na concessão de terrenos públicos estejam envolvidas em acordos comerciais nacionais ou internacionais, como a polêmica moratória da soja, estabelecida em 2006 para restringir a compra de soja de áreas desmatadas no bioma amazônico após 2008, mesmo que legalmente.
Rebeca Youssef, advogada especialista em agronegócios, explicou que o PL tem um impacto significativo para o setor. “Essa é a primeira resposta legislativa direta contra acordos comerciais com restrições ambientais mais severas do que nossa própria legislação. Empresas que aderem a esses acordos podem perder incentivos fiscais, o que pode gerar uma reavaliação de sua adesão a tais políticas”, disse.
O impacto na cadeia produtiva
A nova lei abre uma discussão mais ampla sobre a relação entre o cumprimento das exigências da moratória da soja e a legislação ambiental brasileira, uma das mais restritivas do mundo. No bioma amazônico, por exemplo, é exigido que 80% das propriedades sejam mantidas como reserva legal, restando apenas 20% para atividades agropecuárias. Produtores que desmataram legalmente após 2008, dentro dos limites do Código Florestal, ainda assim encontram dificuldades em comercializar sua produção devido às restrições da moratória.
Youssef destacou a gravidade da situação: “Produtores rurais que agiram de forma legal ainda são excluídos do mercado formal por acordos comerciais, o que sufoca economicamente muitos deles. Isso cria um paradoxo, onde eles estão em conformidade com a legislação brasileira, mas são penalizados por não se adequarem a acordos privados, como a moratória da soja.”
Repercussões para o mercado
Com a sanção da lei, empresas signatárias de acordos como a moratória da soja terão que reavaliar sua posição no mercado. A advogada observa que, embora a resposta não seja imediata, há uma tendência de que essas empresas revisem sua participação nesses acordos, especialmente considerando a perda de incentivos fiscais.
Além disso, Youssef apontou que a moratória da soja, embora polêmica por restringir áreas legalmente desmatadas, mantém critérios importantes para o mercado formal de grãos, como o combate ao desmatamento ilegal, a proteção de territórios indígenas e unidades de conservação, e a garantia de condições de trabalho no campo. “Os critérios relacionados ao desmatamento ilegal e a áreas protegidas continuarão a ser seguidos, mas o boicote a áreas legalmente desmatadas ainda será um ponto de debate”, afirmou.
A entrada em vigor do PL 226/2022 marca um novo capítulo nas discussões sobre acordos comerciais e legislações ambientais no Brasil, criando um cenário de incertezas para empresas e produtores rurais envolvidos na cadeia produtiva da soja.