
O novo relatório da FGV Agro trouxe à tona os principais gargalos para que o mercado de carbono regulado no Brasil avance com segurança e transparência. Em entrevista ao Planeta Campo, o pesquisador Leonardo Munhoz, da FGV Agro e FGV Bio, explicou os impactos da nova legislação aprovada em 2024 e as lacunas que ainda afastam os investidores dos ativos ambientais.
Segundo Munhoz, embora a Lei 15.042/2024 tenha oficializado a criação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), ainda faltam regras infra legais claras sobre como esses créditos serão negociados na bolsa de valores. “Hoje, o distanciamento entre ativos ambientais e o mercado financeiro se dá pela ausência de uma regulamentação robusta e específica”, afirma o pesquisador.
Papel da CVM será decisivo para dar segurança jurídica
De acordo com o relatório, os créditos de carbono regulados passaram a ser considerados valores mobiliários, ou seja, podem ser negociados sob supervisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). No entanto, a definição da natureza jurídica desses ativos ainda é vaga, o que pode trazer insegurança para investidores e dificultar a precificação adequada dos títulos.
“A lei define a natureza jurídica apenas para créditos florestais do mercado voluntário, classificando-os como fruto civil. Isso ainda é muito genérico”, explica Munhoz. Ele destaca que, para garantir a atratividade do setor, será fundamental que a CVM detalhe as regras de negociação, garantindo transparência, padronização e integridade dos ativos.
Transparência e padronização são caminhos contra o greenwashing
O relatório da FGV também alerta para o risco de fraudes e de greenwashing, especialmente com projetos voluntários de baixa rastreabilidade. Como exemplo, Munhoz cita o modelo europeu, que após escândalos envolvendo créditos de carbono, passou a exigir a inclusão dos ativos em um sistema financeiro mais transparente, o MIFID.
“Esse tipo de medida aumenta a confiabilidade do mercado, e o Brasil pode se inspirar nesse modelo. Se quisermos um sistema eficiente, precisamos garantir que todos os créditos sejam verificados com critérios técnicos rigorosos e auditáveis”, reforça.
Fungibilidade dos ativos e integração entre mercados
Outro ponto destacado no estudo é a fungibilidade dos créditos de carbono, ou seja, a capacidade de um ativo ser trocado por outro de valor equivalente. A nova lei permite que ativos regulados, como cotas e certidões de redução de emissões (CRVE), sejam fungíveis entre si, o que aumenta a liquidez do mercado.
Contudo, os créditos do mercado voluntário ainda enfrentam barreiras, pois têm preços e metodologias variadas. A ideia é que, para integrar o SBCE, esses ativos passem por um processo de conversão e auditoria. “A fungibilidade é o que vai garantir uma negociação em larga escala e um mercado robusto no Brasil”, explica Munhoz.
Caminhos para o fortalecimento do mercado de carbono
O estudo da FGV Agro aponta que o mercado de carbono brasileiro pode ser uma alavanca importante para a economia verde, mas depende de segurança jurídica e de um ambiente regulatório claro e confiável. A consolidação do SBCE, aliada à atuação estratégica da CVM, será essencial para aproximar os ativos ambientais dos investidores.
“O Brasil tem um potencial enorme nesse setor, mas precisa resolver as pendências jurídicas e técnicas que hoje criam uma barreira de entrada”, conclui Munhoz. A expectativa é que, nos próximos meses, novas resoluções detalhem os procedimentos operacionais e tragam confiança para produtores, empresas e o mercado financeiro.