SERÁ QUE É LEGAL?

Tarifas dos EUA abrem mercado ao Brasil, mas desafiam regras globais

Adoção de novas tarifas pelos EUA pode beneficiar o Brasil no curto prazo, mas esbarra em normas da OMC e pode gerar retaliações complexas no comércio internacional.

Tarifas dos EUA abrem mercado ao Brasil, mas desafiam regras globais

As novas tarifas de importação impostas pelos Estados Unidos, especialmente sob a gestão do ex-presidente Donald Trump, reacenderam debates sobre o protecionismo e as consequências para o comércio internacional. No curto prazo, essas medidas podem até abrir espaço para o Brasil ampliar suas exportações agropecuárias, mas o cenário é mais complexo do que parece.

Retaliações em cadeia e risco de crise global

As tarifas impostas a países como China e Canadá e a setores estratégicos, como aço e alumínio, estão sendo interpretadas como ilegais pela Organização Mundial do Comércio (OMC), segundo o advogado Leonardo Munhoz, comentarista do quadro Será que é Legal?, do programa Planeta Campo.

“A OMC não permite tarifas discriminatórias ou arbitrárias. O que vemos agora são ações unilaterais e protecionistas que rompem com as normas criadas após a Segunda Guerra para garantir estabilidade nas trocas globais”, explica Munhoz.

A resposta de países afetados veio em forma de retaliações comerciais. A China, por exemplo, já impôs tarifas de 10% em resposta às ações americanas, e a União Europeia prepara contramedidas mirando setores estratégicos ligados à base eleitoral republicana nos EUA.

O impacto direto no agro brasileiro

Com os EUA enfrentando restrições na exportação para grandes mercados, produtos brasileiros podem ganhar espaço na China e na Europa. Isso inclui commodities agrícolas como soja, milho, carne bovina e etanol.

“O Brasil pode se beneficiar ao substituir os EUA em determinadas cadeias de fornecimento. Isso pode até enfraquecer a oposição europeia ao acordo entre Mercosul e União Europeia, já que o bloco passaria a depender mais do agro brasileiro”, avalia Munhoz.

A resposta brasileira precisa ser estratégica

Apesar da tentação de adotar medidas de retaliação imediatas, Munhoz alerta para os riscos de decisões impulsivas. A CAMEX (Câmara de Comércio Exterior) já possui prerrogativas legais para definir tarifas de retaliação, sem necessidade de novas legislações.

O Projeto de Lei 208, que propunha a reciprocidade ambiental — ou seja, só negociar com países que tivessem legislações equivalentes ao Código Florestal brasileiro — foi suavizado após críticas. O substitutivo da senadora Tereza Cristina prevê respostas mais calibradas e realistas, sem comprometer acordos comerciais existentes.

Sangue frio e pragmatismo em tempos de incerteza

Para Leonardo Munhoz, a melhor saída é o sangue frio diplomático e foco em setores estratégicos. “É hora de inteligência comercial. O protecionismo pode gerar oportunidades, mas também armadilhas. A retaliação deve ser cirúrgica para atingir quem toma as decisões e não prejudicar os próprios mercados nacionais.”

Em um cenário de desorganização nas normas multilaterais, com a OMC sem juízes em sua corte de apelação desde 2019, o Brasil precisa agir com cautela. Medidas baseadas em impulso nacionalista, como a ideia de só negociar com países ambientalmente equivalentes, podem isolar o país, inviabilizar acordos e restringir mercados.

O momento exige equilíbrio: aproveitar brechas comerciais, mas sem romper com os princípios que garantem segurança jurídica no comércio internacional.

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