Rastreabilidade: mapeamento territorial é mais urgente que identificação individual
Um dos principais desafios do Brasil é mostrar para o mercado internacional a origem da carne produzida no país, livre de desmatamento
Uma das demandas dos consumidores mais exigentes e de alguns mercados internacionais é saber a origem da carne brasileira devido, principalmente, às preocupações com desmatamento. Neste sentido, a rastreabilidade animal é uma importante ferramenta para comprovar que a produção de proteína animal acontece em áreas regulares.
“O que a rastreabilidade quer informar, o que o consumidor está perguntando lá fora, o que ele quer saber é se aquele animal não veio de uma fazenda com desmatamento e foi produzido conforme os protocolos socioambientais. Então se você fizer um controle das fazendas onde o gado se origina, você está respondendo essa pergunta fundamental”, explicou Fábio Dias, diretor de relacionamentos da Friboi, durante o segundo dia do evento Agropecuária do Futuro.
Ele esclareceu, no entanto, que a rastreabilidade territorial, do conjunto dos animais, é mais eficiente no sentido de comprovar a origem do rebanho do que a identificação individual.
O brinco eletrônico é uma exigência que está mais relacionada à questões sanitárias e também são grandes aliados para o gerenciamento do rebanho, bem como para a tomada de decisões na fazenda.
Fábio lembrou que o brinco é uma exigência para as exportações, mas, principalmente, para comprovar a qualidade da carne. “O europeu, por exemplo, estabeleceu uma regra há mais de dez anos, que foi quando o Brasil criou o Sisbov, que é o banco de dados nacional, com todos os dados desses animais que tem esse brinco. Esta é uma exigência europeia”, explicou.
No entanto, os desafios atuais estão relacionados a preservação florestal. “A União Europeia queria saber se o animal ficou os últimos 90 dias ali naquela fazenda, que é uma questão sanitária. Agora, eles querem saber sobre uma questão de desmatamento, que é uma questão ambiental, e essa é uma diferença importante”, pontuou Fábio.
Liège Correia, diretora de sustentabilidade da JBS, também acrescentou que o mercado internacional está interessado em saber por onde o gado passou e não em quem são os animais. “Há muita confusão sobre o que é a rastreabilidade. Rastreabilidade é garantir por onde esse animal passou e não quem é esse animal”.
Resposta complexa
Conhecer a trajetória dos animais ao longo da vida, durante os diferentes ciclos de produção, é uma tarefa bastante complexa. “Ele nasceu em uma fazenda, dessa fazenda ele vai para outra, no lote ele engorda, vira boi magro, ele se junta a um outro lote com outros bezerros que são vendidos para uma outra fazenda, então todo esse lote de animais, mais importante do que a gente individualizar os animais, é a gente garantir que as áreas, os territórios por onde esses animais passaram, são livres de desmatamento e de questões socioambientais sensíveis para o mercado consumidor”, defendeu Liège.
Sendo assim, para garantir que os animais foram produzidos em áreas permitidas durante todo o ciclo de produção, cada produtor rural precisa estar engajado. “A questão é como fazer o engajamento do produtor no processo. A gente consegue monitorar com quem a gente faz negócio e ele naturalmente consegue monitorar com quem ele faz negócio. Se essa cadeia do bem for andando a gente vai acabar tendo realmente uma pecuária que está livre de desmatamento, que é o que nos interessa”, declarou Fábio Dias.
Para alcançar esse objetivo é que a JBS lançou no ano passado a plataforma Pecuária Transparente. “O produtor ele não é um criminoso, ele não é um criminoso ambiental, ele tá ali na atividade dele tentando produzir. A gente sabe que o Brasil já tem uma quantidade de áreas que melhoraram as pastagens (…), você produz mais na mesma área sem precisar desmatar, sem precisar abrir novas áreas, e tudo isso a gente precisa mostrar para o mundo que já é feito. Então a JBS investiu na plataforma pecuária transparente para o setor, uma agenda pré-competitiva (…) todos do setor são convidados a participar”, explicou Liège.
Confira o painel dedicado aos debates sobre rastreabilidade no segundo dia do evento Agropecuária do Futuro:
Rastreabilidade no Uruguai
O evento Agropecuária do Futuro também contou com a presença do embaixador do Uruguai no Brasil, Guillermo Valles. Ele contou sobre a experiência do país vizinho com a rastreabilidade para fins sanitários.
No Uruguai, 100% dos animais são identificados individualmente com brinco. A tecnologia foi implantada efetivamente em 2016 no país, após uma crise com febre aftosa que fechou os mercados internacionais para a carne Uruguaia e causou muitos prejuízos, já que às exportações de proteína animal respondiam por, aproximadamente, 25% das exportações do país.
No entanto, para além da sanidade animal, Guillermo ressaltou os desafios em comum que a pecuária dos países do Mercosul enfrentam. “Temos um desafio comum, temos uma opinião pública a nível mundial, sobretudo nas sociedades desenvolvidas, contrárias ao consumo de carne, como se o consumo de carne, por si só, fosse uma coisa negativa. Então esse mito negativo é um desafio comum. Conhecemos bem as propriedades da carne bovina, conhecemos também muito bem quais são os riscos de uma dieta desequilibrada, como o Uruguai mesmo tinha no passado. Mas dizer como se está dizendo no mundo desenvolvido que comer carne é negativo para saúde e para o meio ambiente são mitos (…) que nós temos que confrontar juntos. Essa é minha opinião, junto com os outros parceiros do Mercosul”, disse o embaixador
Confira o segundo dia do evento Agropecuária do Futuro na íntegra
A série de lives Agropecuária do Futuro continua nesta quinta-feira, dia 24, falando sobre os riscos e oportunidades com as legislações na produção de alimentos. Então, acompanhe ao vivo pelo site do Canal Rural, a partir das 17 horas.