O Ibama recentemente notificou cerca de 800 produtores rurais no estado do Pará, determinando que cumpram medidas preventivas contra incêndios. A notificação inclui o nome completo dos produtores e o número do Cadastro Ambiental Rural (CAR) das propriedades, prevendo multas que podem variar entre mil e 75 mil reais por hectare em casos de incêndios não controlados. Para discutir as possíveis implicações dessas notificações e como os produtores podem se proteger legalmente, o Planeta Campo conversou com Rebeca Youssef, advogada especialista em agronegócio.
A notificação do Ibama traz cinco recomendações principais para a prevenção de incêndios nas propriedades rurais: construção de aceiros em torno de reservas legais e Áreas de Preservação Permanente (APPs), treinamento de equipe e disponibilização de materiais para combate ao fogo, manejo adequado de pastagem para evitar o acúmulo de material combustível, vigilância durante os períodos críticos de incêndio, e cumprimento do período proibitivo de uso de fogo no Pará.
“A maioria dessas medidas já é adotada pelos produtores, que têm plena consciência dos prejuízos causados pelos incêndios em suas propriedades”, destaca Youssef. No entanto, ela também alerta para a falta de clareza no edital, que não especifica, por exemplo, a largura dos aceiros ou como comprovar o cumprimento dessas ações.
Uma das principais preocupações levantadas por Rebeca é a interpretação do fogo nas áreas rurais como crime. “Culturalmente, há uma tendência de ver os incêndios em propriedades rurais como criminosos, quando muitos deles são acidentais”, explica. Para os produtores, a grande questão é como comprovar que o incêndio foi acidental e não resultado de práticas criminosas.
Outro ponto sensível da notificação é a ausência de um prazo claro para o cumprimento das medidas e a forma como o Ibama pretende monitorar a situação. Segundo a advogada, a fiscalização será realizada por meio de sensoriamento remoto, o que pode gerar autuações automáticas baseadas em focos de calor. “O produtor terá que comprovar que fez tudo ao seu alcance para evitar o incêndio e que ele foi, de fato, um acidente”, afirma Youssef.
Diante desse cenário, Rebeca Youssef orienta os produtores a documentar todas as suas ações preventivas e de socorro em caso de incêndio. Isso inclui desde fotos e vídeos com coordenadas geográficas até boletins de ocorrência e atas notariais. “O produtor precisa ter evidências de que fez sua parte e que é uma vítima do fogo, não o causador”, aconselha a advogada.
Rebeca também ressaltou que, além da insegurança jurídica, os produtores estão sendo cobrados de forma desproporcional, já que muitos deles não têm o suporte necessário do governo para combater os incêndios. “As exigências feitas aos produtores rurais muitas vezes ultrapassam o que o próprio governo consegue realizar para evitar os incêndios em áreas de mata e rurais”, conclui.
Os produtores agora enfrentam o desafio de cumprir as exigências em um cenário de incertezas, em meio a um aumento expressivo de incêndios em todo o país.