Exportações brasileiras de commodities podem ser “potencialmente afetadas” pelas novas regras ambientais da UE

Em entrevista ao Planeta Campo, Diretor Executivo e sócio da BCG, Arthur Ramos, fala sobre uma análise que aponta uma série de dificuldades que o Brasil pode enfrentar para comprovar a produção em áreas de desmatamento legal, aquele feito com a autorização de todos os órgãos competentes

Uma análise recente conduzida pelo BOSTON CONSULTING GROUP (BCG) demonstra como as novas regulamentações ambientais da União Europeia podem causar uma transformação substancial no cenário do comércio global. O impacto deve atingir grande parte dos setores exportadores, principalmente em mercados emergentes, como o Brasil – na exportação de commodities agrícolas e industriais.

O BCG aponta duas medidas que terão impacto mais significativo no país, que são o Mecanismo de Fronteira para Ajuste de Carbono (CBAM, na sigla em inglês) e a Regulação de Desmatamento da UE (EUDR). O primeiro envolve uma taxa sobre as emissões de CO2 associadas a algumas commodities industriais importadas por países europeus, como aço, alumínio e produtos químicos. A medida entra em vigor a partir de 2026, sendo que o período de transição já começou, e importadores da UE já têm de reportar o total de emissões de carbono embutidas em seus produtos.

Já a EUDR, proíbe a comercialização de commodities que vêm de áreas de desmatamento, visando reduzir seu consumo no mercado da União Europeia. Commodities como cacau, café, óleo de palma e madeira só poderão ser comercializadas se forem provenientes de solo não desmatado (legal ou ilegalmente), ou que não tenham induzido a degradação florestal após 31 de dezembro de 2020, o que afetará setores de exportação importantes na África, Sudeste Asiático e na América Latina.

Um aspecto importante que deve ser explorado é a falta de compreensão por parte da União Europeia da diferenciação que existe no Brasil entre desmatamento legal e ilegal.

“Acho que não é perfeitamente compreendida. Como todos os assuntos relacionados ao tema de emissões, carbono zero e ao risco dessas atividades, sempre vai uma margem a hora que você entra em uma regulação específica. É importante ir a fundo e esclarecer as diferenças para conseguir que o argumento correto triunfe. Em geral, os investidores internacionais veem como positivo o Brasil ter o Código Florestal. Mas, evidentemente, as vezes as narrativas predominam e grande parte não tem o conhecimento técnico”, disse Diretor Executivo e sócio da BCG, Arthur Ramos.

Soja

Foto: Envato

Um dos desafios que as empresas brasileiras enfrentarão por conta das regulações europeias, principalmente referente ao desmatamento, é garantir a rastreabilidade de ponta a ponta, em especial para a carne bovina (do criador ao importador). “Garantir a procedência e ter a visão completa da cadeia de valor ainda não é uma realidade, e requer investimentos relevantes. Ainda há uma grande complexidade para execução, devido a um território com dimensões continentais como o do Brasil”, diz Arthur. A padronização é outro obstáculo, por conta da falta de uniformidade nas exigências de emissões entre países europeus, Brasil e outros destinos.

Apesar disso, as pesquisas do BCG mostram que grandes empresas de mercados emergentes que lideram a jornada da sustentabilidade climática geram retornos totais aos acionistas (TSR) 105% superiores ao Índice MSCI de Mercados Emergentes de 2017 a 2022. Empresas que atendem a padrões elevados de conformidade com metas climáticas também desfrutam de maior acesso a capital de investimento e atraem mais talentos, além de terem mais oportunidades para mudar a dinâmica em seus setores com modelos de negócios voltados à sustentabilidade.

Ainda segundo Arthur, as exportações de commodities agrícolas devem ser mais afetadas que as do setor industrial. Por outro lado, os europeus têm menor relevância na pauta de exportação do agro do que outras nações. “O peso das exportações para o mercado europeu é menor que outros países e está concentrado principalmente na soja. É importante ver alguma exposição, mas o peso é relativamente menor em relação às commodities agrícolas. No lado industrial, já é uma outra história, é relevante. Mas ao mesmo tempo tende a nos favorecer pelo fato de termos uma matriz energética e uma matriz elétrica limpas, então isso deveria nos possibilitar uma vantagem competitiva”.

Empresas em mercados em desenvolvimento ainda têm tempo para adotar as medidas necessárias para continuarem competitivas na União Europeia. É importante que as organizações se preparem para atingir padrões de sustentabilidade em diversas dimensões, como mapear a relevância das regulamentações para os negócios, identificar lacunas em medição, reporte e capacidade da empresa em oferecer produtos de baixo carbono, e desenvolver um mapa de todas as operações para a transformação de sustentabilidade, identificando as ações que irão melhorar o desempenho nos quesitos socioambientais.

“Desde 2015 vemos a proliferação de novas regulamentações climáticas no mercado global, e a tendência é que as exigências fiquem cada vez maiores para exportações. Entrar em conformidade com essas novas regras é possível, e estar na vanguarda do movimento sustentável pode criar vantagens competitivas a longo prazo”, finaliza Arthur.

Texto com informações do BCG
A análise completa está disponível, em inglês, no site do BCG