Retrospectiva 2024: Um Ano de Desafios, Oportunidades e Reflexões para a Sustentabilidade

Retrospectiva 2024
O ano de 2024 foi marcado por desafios e oportunidades significativas na agenda da sustentabilidade no Brasil e no mundo. Eventos climáticos extremos, como enchentes no Sul e secas severas na Amazônia, destacaram a urgência de políticas de adaptação e resiliência. A aprovação histórica do mercado de carbono no Brasil trouxe novas perspectivas econômicas, incentivando práticas produtivas de baixo carbono.

No cenário internacional, o Brasil se destacou na COP16 da Biodiversidade, na Colômbia, e na COP29 do Clima, no Azerbaijão, além de sediar a Cúpula do G20 no Rio de Janeiro, onde apresentou a Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza. No entanto, as eleições municipais evidenciaram a desconexão entre a política local e a agenda ambiental, reforçando a necessidade de integrar sustentabilidade no planejamento urbano.

À medida que avançamos para 2025, os aprendizados de 2024 nos mostram que o equilíbrio entre crescimento econômico, conservação ambiental e inclusão social é o caminho para um futuro mais resiliente e próspero.

Retrospectiva 2024: Um Ano de Desafios, Oportunidades e Reflexões para a Sustentabilidade

Retrospectiva

Retrospectiva

O ano de 2024 foi um marco decisivo em nossa jornada rumo à sustentabilidade. Marcado por eventos climáticos extremos, decisões políticas estratégicas, debates internacionais e tensões comerciais, o ano trouxe à tona não apenas os desafios, mas também as oportunidades de transformação que moldarão o futuro do Brasil e do mundo. A complexidade do cenário global, em um contexto de mudança do clima, transições econômicas e crises socioambientais, reforçou a necessidade urgente de repensarmos nossos modelos de desenvolvimento e a relação entre produção, consumo e conservação dos recursos naturais.

Como uma potência agrícola e ambiental, o Brasil se encontrou no epicentro dessas discussões. Por um lado, o país sofreu intensamente os impactos das mudanças climáticas, com desastres naturais que expuseram nossa vulnerabilidade em termos de infraestrutura, gestão de recursos e políticas de adaptação. Por outro, o Brasil reafirmou sua posição de protagonismo internacional ao liderar iniciativas de desenvolvimento sustentável, como a regulamentação do mercado de carbono, sediar eventos globais, como o G20, e fortalecer seu papel nas COPs de Clima e Biodiversidade.

Esse protagonismo, no entanto, também veio acompanhado de desafios, como o crescente questionamento sobre a sustentabilidade da produção agropecuária brasileira, que resultou em boicotes internacionais. Isso nos leva a refletir sobre a necessidade de comunicar de forma mais eficaz os avanços reais na sustentabilidade do agro nacional e, ao mesmo tempo, aprimorar nossas práticas em larga escala para fortalecer a credibilidade no mercado global.

O ano também foi marcado por decisões políticas importantes, como a aprovação do Projeto de Lei do Mercado de Carbono, que tem o potencial de transformar a economia brasileira ao inserir o país em uma economia global de baixo carbono. A legislação oferece oportunidades únicas para o agronegócio, um setor com imenso potencial de descarbonização e geração de créditos de carbono.

Além dos avanços econômicos e legislativos, 2024 trouxe eventos climáticos extremos que nos lembraram da urgência de medidas de adaptação e resiliência. As enchentes no Rio Grande do Sul, a seca severa na Amazônia, Pantanal e Cerrado, e os incêndios devastadores expuseram a necessidade de políticas públicas mais robustas e de um esforço conjunto entre governos, empresas e sociedade civil para construir um Brasil mais resiliente.

Nesta retrospectiva, revisaremos os principais acontecimentos que marcaram 2024, analisando os impactos climáticos, políticos, econômicos e sociais que moldaram o cenário nacional e global. Veremos como esses eventos desafiaram nossa capacidade de resposta, evidenciaram nossas fragilidades e, ao mesmo tempo, apresentaram oportunidades para inovar, liderar e preparar o terreno para um futuro mais sustentável, justo e próspero.

Esta é mais do que uma análise dos fatos; é um convite à reflexão sobre os caminhos que devemos trilhar em 2025 e além. O equilíbrio entre crescimento econômico, conservação ambiental e inclusão social não é mais uma escolha — é um imperativo. E o Brasil, com sua riqueza natural, seu potencial agrícola e sua posição estratégica no cenário global, tem a responsabilidade e a oportunidade de liderar essa transformação.

Vamos, então, revisitar os marcos de 2024 com a intenção de aprender com os desafios, celebrar as conquistas e traçar, juntos, um caminho mais resiliente e sustentável para o futuro.

 

1. Eventos Extremos no Brasil: A Urgência das Políticas de Adaptação

O ano de 2024 trouxe à tona, de forma inequívoca, a vulnerabilidade do Brasil frente às mudanças do clima, expondo lacunas em nossas políticas públicas, infraestrutura e capacidade de resposta a desastres. De um lado, chuvas históricas causaram destruição no Sul do Brasil; do outro, o país testemunhou uma seca prolongada que afetou duramente a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal. Esses eventos não foram isolados ou acidentais, mas parte de um padrão preocupante de extremos climáticos cada vez mais intensos e recorrentes, conforme preveem os estudos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).

O impacto desses eventos foi profundo e multifacetado, atingindo a economia, as comunidades rurais e urbanas, os ecossistemas e a segurança alimentar do país. Adaptação às mudanças climáticas deixou de ser um debate acadêmico ou político e tornou-se uma necessidade urgente e prática.

Chuvas Históricas no Rio Grande do Sul: O Peso da Vulnerabilidade

Em meados de 2024, o Rio Grande do Sul foi palco de uma das maiores tragédias climáticas da última década. As chuvas contínuas e de alta intensidade provocaram enchentes que ultrapassaram os registros históricos. Rios transbordaram, atingindo áreas urbanas e rurais, enquanto encostas cederam, destruindo estradas e interrompendo serviços essenciais.

Impactos Econômicos: Prejuízos Bilionários

O setor agropecuário, um dos motores econômicos do Rio Grande do Sul, foi duramente afetado:

  • Produção de Arroz e Soja: As plantações, prontas para a colheita, foram submersas, causando perdas massivas. Estima-se que a produção de arroz, pela qual o estado é referência nacional, tenha encolhido em 30%.
  • Pecuária de Corte: Pequenos e médios pecuaristas perderam rebanhos inteiros em razão das enchentes, enquanto o fornecimento de ração e água potável tornou-se inviável em muitas regiões.
  • Infraestrutura Comprometida: O impacto econômico se agravou com a destruição de pontes, estradas e sistemas de drenagem, dificultando o escoamento da produção e elevando os custos de transporte.

A pressão sobre os cofres públicos foi intensificada pela necessidade imediata de reconstrução, com estimativas de que os custos de recuperação ultrapassaram R$ 15 bilhões. Municípios dependentes do agronegócio e do comércio sofreram retração econômica, com impactos no emprego e na arrecadação.

Impactos Sociais: Comunidades Desabrigadas e Vulneráveis

As consequências sociais das enchentes foram igualmente devastadoras:

  • Deslocamento Forçado: Milhares de famílias foram retiradas de suas casas, muitas das quais perderam tudo o que possuíam. Abrigos temporários se tornaram superlotados e inadequados.
  • Pequenos Produtores Rurais: Comunidades rurais sofreram perdas irreparáveis. A falta de acesso a crédito e assistência técnica dificulta a recuperação econômica dessas famílias.
  • Serviços Essenciais Comprometidos: Hospitais, escolas e redes de abastecimento de água foram afetados, deixando populações inteiras sem acesso a serviços básicos.

Esses eventos acentuaram as desigualdades sociais, com comunidades de baixa renda sendo desproporcionalmente impactadas, evidenciando a necessidade de políticas inclusivas de adaptação.

Seca na Amazônia, Cerrado e Pantanal: Um Alerta para os Ecossistemas Tropicais

Enquanto o Sul sofria com o excesso de chuvas, o Norte e o Centro-Oeste do país enfrentaram um cenário oposto: seca prolongada e escassez hídrica.

Perdas Agrícolas e Econômicas

A estiagem afetou diretamente a produção agrícola, especialmente culturas dependentes de chuvas regulares:

  • Milho e Soja: A produtividade foi reduzida em até 20% em algumas regiões, prejudicando a renda dos produtores e encarecendo os alimentos no mercado interno.
  • Agronegócio Exportador: A seca também afetou cadeias de exportação, gerando preocupação nos mercados internacionais e resultando em perdas econômicas bilionárias.

A Intensificação de Incêndios e o Desmatamento

A combinação de clima seco e uso inadequado da terra intensificou incêndios em áreas vulneráveis, especialmente no Cerrado e no Pantanal.

  • Amazônia: A seca prolongada reduziu o nível dos rios, prejudicando comunidades ribeirinhas que dependem dos cursos d’água para transporte, pesca e abastecimento. Ao mesmo tempo, a vegetação seca facilitou queimadas criminosas, intensificando o desmatamento.
  • Cerrado: Conhecido como a savana mais biodiversa do mundo, o Cerrado enfrentou incêndios que devastaram pastagens naturais e comprometeram a fauna e a flora únicas desse bioma.
  • Pantanal: O período de seca extrema no Pantanal reduziu drasticamente as áreas alagadas, essenciais para a reprodução de espécies e a manutenção do equilíbrio ecológico.

Impactos Ambientais e Sociais

Além das perdas econômicas, os impactos ambientais e sociais da seca foram alarmantes:

  • Comunidades Ribeirinhas e Indígenas: A redução dos níveis dos rios dificultou a pesca e o transporte de alimentos e remédios, comprometendo a segurança alimentar dessas populações.
  • Biodiversidade: A seca prejudicou ecossistemas inteiros, causando a perda de habitats e colocando espécies em risco de extinção.

 

O Papel das Políticas de Adaptação: Uma Agenda Inadiável

Os extremos climáticos vivenciados em 2024 reforçam a urgência de políticas robustas de adaptação para proteger as populações, a economia e os ecossistemas brasileiros. A adaptação é um investimento estratégico, essencial para reduzir as vulnerabilidades e preparar o país para enfrentar os desafios das mudanças climáticas.

Medidas Prioritárias:

  1. Sistemas de Alerta Precoce:

Investir em tecnologias de monitoramento meteorológico e sistemas de alerta pode salvar vidas e reduzir prejuízos econômicos, garantindo uma resposta mais rápida e eficaz em casos de desastres.

  1. Infraestrutura Resiliente:
    • Recuperar e modernizar a infraestrutura urbana e rural com foco em resiliência climática, incluindo sistemas de drenagem, pontes e reservatórios.
    • Implementar políticas de saneamento que protejam os recursos hídricos em períodos de seca e excesso de chuvas.
  1. Práticas Sustentáveis no Agronegócio:
    • Incentivar a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) e a recuperação de pastagens degradadas como estratégias para aumentar a resiliência das propriedades rurais.
    • Promover o uso de tecnologias de irrigação eficiente e monitoramento climático em tempo real para minimizar perdas produtivas.
  1. Recuperação e Conservação de Ecossistemas:
    • Priorizar a restauração de áreas degradadas, como florestas e nascentes, fundamentais para regular o ciclo da água e proteger a biodiversidade.
    • Criar incentivos econômicos para proteger o Pantanal, a Amazônia e o Cerrado, combatendo queimadas e o desmatamento ilegal.
  1. Políticas Públicas Inclusivas:

Garantir que comunidades mais vulneráveis, como pequenos produtores e populações tradicionais, tenham acesso a crédito, assistência técnica e programas de capacitação.

A Resiliência é o Caminho

Os eventos climáticos extremos de 2024 deixaram claro que não há mais tempo a perder. A adaptação às mudanças climáticas deve ser tratada como prioridade nacional, com políticas integradas, investimentos contínuos e ações conjuntas entre o setor público, o privado e a sociedade civil.

O Brasil, com sua diversidade climática, ecológica e econômica, tem a oportunidade de se tornar um líder global em resiliência climática, adotando soluções inovadoras que protejam as populações, fortaleçam a economia e conservem os recursos naturais. É hora de agir, pois a resiliência será a chave para enfrentar os desafios do presente e construir um futuro mais sustentável e seguro para todos.

 

2. Aprovação do Projeto de Lei do Mercado de Carbono: Um Marco para a Descarbonização Brasileira

No dia 11 de dezembro de 2024, o Brasil deu um passo histórico rumo à transição para uma economia de baixo carbono com a sanção presidencial da Lei nº 15.042/2024. Essa lei institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) e traz uma regulamentação robusta para o mercado nacional de créditos de carbono. Trata-se de um avanço essencial para que o Brasil possa cumprir suas metas climáticas e fortalecer sua posição no cenário global como um dos maiores potenciais para mitigação e captura de carbono.

O mercado de carbono, como definido na nova lei, cria incentivos econômicos para a redução de emissões e a adoção de práticas sustentáveis, permitindo que setores produtivos e empresas transformem suas ações em ativos negociáveis. Em um país de dimensões continentais como o Brasil, o impacto dessa legislação promete ser expressivo, especialmente no setor agropecuário.

O Que Muda com a Lei 15.042/2024?

A nova lei institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), estruturando o mercado de carbono no Brasil por meio de uma regulação nacional detalhada. A seguir, destacam-se os principais elementos da lei:

1. Regulamentação Nacional e Governança:

  • O SBCE terá um órgão gestor responsável por regulamentar, monitorar e fiscalizar as transações de Cotas Brasileiras de Emissões (CBEs) e Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVEs).
  • A lei assegura transparência, previsibilidade e segurança jurídica para os participantes do mercado, além de mecanismos para evitar a dupla contagem de emissões.
  • A governança é centralizada em um Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima (CIM), garantindo a integração com a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC).

2. Instrumentos Econômicos para Redução de Emissões:

  • CBEs: Representam o direito de emissão de 1 tonelada de CO₂ equivalente (tCO₂e), sendo alocados de forma gratuita ou onerosa.
  • CRVEs: Correspondem à redução ou remoção efetiva de emissões e podem ser gerados por projetos de mitigação com metodologias verificadas.
  • Empresas sujeitas à regulamentação devem reportar suas emissões, apresentar planos de monitoramento e realizar a conciliação periódica de obrigações, garantindo que suas emissões sejam compensadas.

A Participação do Setor Agropecuário

A lei, em seu Art. 1º, §2º e §3º, protege a produção primária agropecuária, ao excluí-la das obrigações diretas do SBCE. No entanto, as emissões líquidas e remoções em propriedades rurais poderão ser contabilizadas voluntariamente como parte do processo produtivo das empresas reguladas. Isso oferece ao agro uma oportunidade estratégica para se posicionar como protagonista no mercado de carbono, com benefícios econômicos e ambientais.

Práticas que Geram Créditos de Carbono no Agro:

  1. Recuperação de Pastagens Degradadas:
    O Brasil possui cerca de 80 milhões de hectares de pastagens degradadas. Recuperá-las não apenas remove carbono atmosférico, mas também aumenta a produtividade e a rentabilidade das áreas.
  2. Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF):
    Sistemas integrados promovem a sequestração de carbono no solo e otimizam o uso da terra, mitigando emissões de metano e nitrogênio.
  3. Sistemas Agroflorestais:
    A combinação de árvores com culturas e pastagens contribui para a remoção de GEE, melhora a resiliência climática das propriedades e valoriza os produtos agrícolas.
  4. Manejo Sustentável de Fertilizantes e Resíduos:
    Técnicas como o uso eficiente de fertilizantes nitrogenados, compostagem e bioinsumos reduzem as emissões de óxido nitroso (N₂O), um dos gases mais potentes em termos de aquecimento global.

Essas práticas não apenas geram ativos ambientais valiosos (CRVEs), mas também tornam o setor agropecuário mais competitivo, resiliente e alinhado às exigências dos mercados internacionais.

Impactos e Oportunidades para o Brasil

A regulamentação do mercado de carbono no Brasil traz uma série de impactos positivos e abre um leque de oportunidades:

1. Liderança Global em Sustentabilidade:

O Brasil, com sua riqueza de biomas e potencial de captura de carbono, tem uma vantagem competitiva significativa. A regulamentação coloca o país como um player de destaque no mercado internacional de carbono.

2. Atração de Investimentos:

A nova lei cria um ambiente propício para a entrada de investidores nacionais e estrangeiros, interessados em financiar projetos de descarbonização e geração de créditos de carbono. Projetos de REDD+, reflorestamento e tecnologias de captura de carbono tornam-se mais atrativos.

3. Monetização de Ações Sustentáveis:

Setores como o agro, a indústria e a energia poderão monetizar suas ações climáticas, transformando práticas sustentáveis em ativos financeiros negociáveis, tanto no mercado regulado (SBCE) quanto no mercado voluntário.

4. Incentivo à Inovação e Tecnologias de Baixo Carbono:

A nova legislação incentiva a adoção de tecnologias mais limpas e eficientes, promovendo inovação em setores como a agropecuária, a geração de energia e a indústria.

5. Fortalecimento da Governança Climática:

O sistema traz transparência e rastreabilidade para as transações de carbono, garantindo integridade ambiental e alinhamento com os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil no âmbito do Acordo de Paris.

Próximos Passos: A Implementação Gradual do SBCE

A Lei 15.042/2024 prevê um cronograma de implementação em fases:

  1. Regulamentação Inicial (Fase I): Nos primeiros 12 meses, as regras do SBCE serão detalhadas e consolidadas.
  2. Fase de Monitoramento (Fase II e III): Empresas deverão reportar suas emissões e planos de monitoramento.
  3. Plena Operacionalização (Fase IV e V): A partir da vigência do primeiro Plano Nacional de Alocação, as CBEs e CRVEs passarão a ser negociadas de forma obrigatória e integrada.

Um Marco para o Futuro Sustentável do Brasil

A sanção da Lei nº 15.042/2024 marca um divisor de águas na política climática brasileira. O país passa a contar com um sistema estruturado, transparente e alinhado aos padrões internacionais para enfrentar o desafio das mudanças climáticas.

Para o setor agropecuário, o mercado de carbono representa uma janela de oportunidades única, combinando eficiência produtiva com sustentabilidade ambiental. O Brasil está preparado para liderar essa nova economia de baixo carbono, convertendo desafios em soluções inovadoras que beneficiarão a sociedade, a economia e o meio ambiente.

O sucesso, no entanto, dependerá de diálogo entre os setores, investimentos contínuos em tecnologia e capacitação, e o comprometimento com uma transição justa e inclusiva. O Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões não é apenas uma política econômica; é um instrumento de transformação, capaz de posicionar o Brasil como referência global em sustentabilidade.

 

3. COP16 de Biodiversidade e COP29 do Clima: O Brasil no Cenário Global

O ano de 2024 foi palco de dois eventos globais fundamentais para a agenda ambiental: a 16ª Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade (COP16) e a 29ª Conferência das Partes sobre Mudança do Clima (COP29). Ambos os eventos reafirmaram a urgência da cooperação internacional para enfrentar a crise ambiental, colocando países como o Brasil no centro das discussões e das expectativas globais.

COP16: A Proteção e Uso Sustentável da Biodiversidade

Cop16

Realizada entre 21 de outubro e 1 de novembro de 2024, em Cali, na Colômbia, a COP16 teve como tema central “A paz com a natureza”, reforçando a necessidade de um pacto global para harmonizar a convivência humana com os ecossistemas naturais. A conferência foi a primeira após a aprovação do Marco Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal, em 2022, e buscou avançar na implementação efetiva das metas propostas para a preservação e uso sustentável da biodiversidade até 2030.

A COP16 reuniu mais de 190 países, além de representantes da sociedade civil, setor privado e academia, consolidando um amplo debate sobre os principais desafios e oportunidades para a conservação global da biodiversidade.

Principais Temas e Compromissos

Os debates se concentraram na operacionalização do Marco Global de Biodiversidade, com ênfase nos seguintes compromissos:

  • Conservação de 30% dos solos e oceanos até 2030, com esforços coordenados para criar e expandir áreas protegidas.
  • Restauração de 20% dos ecossistemas degradados, focando especialmente em biomas críticos, como florestas tropicais, recifes de corais e áreas úmidas.
  • Redução da introdução de espécies invasoras, uma das principais ameaças à biodiversidade nativa.
  • Redução do uso de nutrientes e produtos químicos prejudiciais, como pesticidas e fertilizantes, para minimizar impactos ambientais.
  • Eliminação do despejo de resíduos plásticos nos ecossistemas terrestres e aquáticos, com ações globais coordenadas.
  • Mitigação dos impactos das mudanças climáticas sobre a biodiversidade, integrando soluções baseadas na natureza às estratégias de adaptação e mitigação.
  • Financiamento para países menos desenvolvidos, visando garantir os recursos necessários para implementar as metas de conservação.
  • Partilha justa e equitativa dos benefícios derivados da utilização de sequências digitais de recursos genéticos.

Resultados e Limitações

Apesar de avanços no estabelecimento de compromissos, a COP16 encerrou com resultados limitados em temas cruciais, especialmente no que diz respeito ao financiamento global para ações de conservação da biodiversidade. Países menos desenvolvidos, que abrigam ecossistemas essenciais, reforçaram a necessidade de apoio financeiro e tecnológico para implementar as metas propostas.

O Brasil, como detentor da maior biodiversidade do planeta, desempenhou um papel ativo nas negociações, defendendo a valorização dos serviços ecossistêmicos e da bioeconomia como caminhos para promover a conservação aliada ao desenvolvimento sustentável. O país destacou práticas como:

  • O uso sustentável de produtos florestais não madeireiros.
  • A valorização dos conhecimentos tradicionais das comunidades indígenas e locais como aliados fundamentais na preservação da biodiversidade.
  • O compromisso em reduzir o desmatamento e recuperar áreas degradadas, em especial na Amazônia e no Cerrado.

COP29: Avanços na Mitigação e Adaptação Climática

Cop29 2 | Planeta Campo

Paralelamente, a COP29 sobre Mudança do Clima, realizada em Baku, Azerbaijão, colocou em pauta o aumento das ambições globais para mitigação das emissões de gases de efeito estufa (GEE) e o fortalecimento das políticas de adaptação climática. O encontro foi marcado pela urgência em alinhar as ações nacionais com o objetivo de limitar o aquecimento global a 1,5°C, conforme o Acordo de Paris.

Temas Centrais e Avanços

  1. Aumento das Metas Climáticas (NDCs):
    Países apresentaram revisões de suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), com compromissos mais robustos para redução das emissões até 2030. O Brasil anunciou metas ambiciosas:
    • Redução de 53% das emissões de GEE até 2030.
    • Neutralidade climática até 2050.
    • Ampliação de investimentos em energias renováveis e descarbonização da agropecuária.
  1. Financiamento Climático:
    O debate sobre o Fundo de Perdas e Danos avançou, garantindo apoio financeiro para países vulneráveis que enfrentam os maiores impactos climáticos. O Brasil, junto ao G77+China, pressionou por compromissos claros dos países desenvolvidos.
  2. Transição Energética Justa:
    A transição para energias limpas foi amplamente discutida, com destaque para o avanço brasileiro em energia solar, eólica e biocombustíveis, consolidando sua posição como líder global em etanol sustentável e tecnologias de baixo carbono.
  3. Mercado de Carbono:
    A regulamentação do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE), pela Lei 15.042/2024, fortaleceu o papel do Brasil no mercado global de carbono. O país apresentou iniciativas como:
    • Recuperação de pastagens degradadas.
    • Expansão da Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF).
    • Soluções baseadas na natureza, como reflorestamento e manejo sustentável do solo.

O Brasil como Protagonista Global

Tanto na COP16 quanto na COP29, o Brasil consolidou sua posição como líder global em biodiversidade e clima. O país demonstrou que soluções baseadas na natureza, aliadas à inovação tecnológica e à valorização das comunidades locais, são estratégias eficazes para enfrentar os desafios ambientais.

As duas conferências também reforçaram a interdependência entre biodiversidade e clima. Ecossistemas saudáveis, como a Amazônia, Pantanal e Cerrado, desempenham papéis essenciais na captura de carbono, regulação do ciclo hidrológico e resiliência climática.

Em um ano de eventos extremos e decisões globais, o Brasil enviou uma mensagem clara: é possível conciliar conservação, desenvolvimento econômico e justiça social. No cenário global, o país segue como guardião da biodiversidade planetária e protagonista no enfrentamento da crise climática.

 

4 – Safra 2024 e os Boicotes Comerciais: Desafios e Estratégias para o Agronegócio Brasileiro

O ano de 2024 trouxe um cenário ambíguo para o agronegócio brasileiro. Por um lado, a safra recorde, mesmo diante dos desafios climáticos, reafirmou a resiliência e a importância do setor agropecuário para a economia nacional. Por outro, o Brasil enfrentou pressões externas na forma de boicotes comerciais, gerando tensões entre o país e importantes mercados consumidores.

Empresas globais, como Danone e Carrefour, anunciaram restrições e boicotes a produtos brasileiros, alegando preocupações com práticas insustentáveis de produção, desmatamento associado à cadeia de commodities e a falta de rastreabilidade na origem dos produtos.

Resultados da Safra 2024: Um Setor Resiliente

Apesar das adversidades climáticas, como enchentes no Sul e a seca prolongada em biomas tropicais, o Brasil conseguiu atingir números expressivos em sua produção agropecuária. A soja, principal commodity agrícola do país, manteve-se como destaque, seguida pelo milho e pela cana-de-açúcar, com produções recordes mesmo em áreas de recuperação de pastagens.

O setor agropecuário também avançou em práticas de manejo sustentável, com aumento na adoção de tecnologias como:

  • Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), combinando produção agrícola, pecuária e florestal de forma sinérgica.
  • Uso de bioinsumos e biotecnologia para reduzir a dependência de fertilizantes sintéticos e agrotóxicos.
  • Recuperação de áreas degradadas com manejo adequado do solo e cobertura vegetal.

Esses avanços foram essenciais para garantir a produtividade e resiliência das lavouras em um ano de condições climáticas extremas.

Os Boicotes Comerciais: Entre a Sustentabilidade e a Guerra Comercial

Os anúncios de boicotes por parte de empresas multinacionais e redes varejistas, como Danone e Carrefour, trouxeram à tona um debate complexo. Sob o argumento de preocupações ambientais e sociais, essas corporações passaram a restringir ou descredenciar fornecedores que não comprovassem práticas sustentáveis. Os principais pontos críticos foram:

  1. Desmatamento e Uso da Terra:
    Produtos associados ao desmatamento, especialmente na Amazônia e Cerrado, foram alvo de restrições. Há uma crescente exigência internacional por rastreabilidade e certificações que garantam que os produtos brasileiros não estão ligados a práticas ilegais de uso da terra.
  2. Pressão dos Consumidores:
    Os mercados europeus, principalmente, têm demonstrado uma demanda crescente por produtos sustentáveis, com consumidores mais exigentes e atentos à origem das mercadorias. Essa pressão reflete-se nas políticas corporativas adotadas por grandes empresas.
  3. Estratégias de Protecionismo Comercial:
    Embora a sustentabilidade seja uma preocupação legítima, muitos analistas questionam se essas ações também não escondem interesses protecionistas de países desenvolvidos, buscando proteger seus mercados internos e dificultar a competitividade das exportações brasileiras.

Essa “guerra comercial velada” reforça uma realidade desconfortável: barreiras não-tarifárias estão se tornando instrumentos recorrentes de pressão contra países exportadores, como o Brasil. Argumentos ambientais são frequentemente usados para desacreditar práticas produtivas, sem levar em conta os avanços reais obtidos pelo agronegócio nacional.

A Necessidade de Melhor Comunicação e Transparência

Independentemente das motivações — genuínas ou protecionistas — os boicotes reforçam a urgência de o Brasil adotar uma postura mais proativa na defesa de sua produção agropecuária. O país precisa melhorar a narrativa global sobre sua sustentabilidade, tornando transparentes suas práticas e políticas.

Estratégias Prioritárias para o Brasil:

  1. Adoção de Certificações e Rastreabilidade:
    Expandir sistemas robustos de rastreabilidade, como o CAR (Cadastro Ambiental Rural) e plataformas privadas de monitoramento. Certificações internacionais, como as de cadeia de custódia sustentável, devem ser incentivadas entre os produtores.
  2. Comunicação Transparente:
    O Brasil precisa investir em campanhas globais de comunicação, mostrando os avanços na redução do desmatamento, adoção de tecnologias de baixo carbono e conservação de ecossistemas. A narrativa deve destacar práticas sustentáveis como:

    • Recuperação de pastagens degradadas;
    • Expansão de agricultura regenerativa;
    • Uso de energia limpa na produção agroindustrial.
  3. Diplomacia Ambiental e Comercial:
    Fortalecer o diálogo com mercados estratégicos, especialmente a União Europeia, promovendo acordos bilaterais que reconheçam os esforços brasileiros em sustentabilidade e incentivem comércio justo.
  4. Reconhecimento da Agricultura como Parte da Solução Climática:
    O agronegócio brasileiro, se bem gerido, é parte fundamental da solução para a crise climática, fornecendo alimentos para o mundo e atuando como sequestrador de carbono. A valorização das soluções baseadas na natureza, como reflorestamento e manejo integrado, deve ser parte central da comunicação brasileira.

Oportunidade em Meio à Crise

Os boicotes comerciais de 2024, embora representem desafios significativos, também servem como um alerta e uma oportunidade. O Brasil, como potência agroambiental, tem a capacidade de liderar globalmente com práticas produtivas sustentáveis, equilibrando crescimento econômico e conservação ambiental.

O caminho para superar as barreiras impostas passa por transparência, inovação e uma diplomacia ativa que valorize o papel do agronegócio brasileiro na segurança alimentar global e na agenda de descarbonização. O momento exige não apenas defender o setor, mas redefinir o protagonismo do Brasil em um mundo que busca, cada vez mais, soluções sustentáveis e integradas.

 

5 – Cúpula do G20: O Brasil no Centro das Decisões Globais

G20

Em novembro de 2024, o Brasil assumiu um papel histórico ao sediar, pela primeira vez, a Cúpula do G20, realizada no Rio de Janeiro. O evento reuniu líderes das principais economias do mundo, representando 85% do PIB global e cerca de 75% do comércio internacional, consolidando a posição do país como um ator estratégico em temas centrais para o futuro do planeta, como fome, pobreza, transição energética e desenvolvimento sustentável.

O encontro foi marcado por debates intensos, articulações diplomáticas e propostas ambiciosas que buscaram enfrentar os desafios globais mais urgentes, reforçando o compromisso do Brasil em promover soluções sustentáveis, inclusivas e de impacto global.

A Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza: Um Marco Diplomático Brasileiro

Um dos principais resultados da cúpula foi a proposta brasileira de criação da Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza. Inspirada nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), a iniciativa tem como propósito erradicar a fome e reduzir os níveis de pobreza extrema no mundo, especialmente nos países em desenvolvimento. O projeto coloca o Brasil como protagonista de uma agenda social global, combinando cooperação multilateral, transferência de tecnologia e investimentos estratégicos.

Pontos-Chave da Aliança:

  • Financiamento Inovador: Criação de um fundo multilateral com contribuições públicas e privadas para financiar programas de combate à fome e à pobreza, especialmente em áreas rurais.
  • Transferência de Conhecimento e Tecnologia: Compartilhamento de práticas agrícolas sustentáveis, sistemas de produção de alimentos de baixo carbono e tecnologias inovadoras para aumentar a segurança alimentar.
  • Inclusão Social: Foco em populações vulneráveis, com ênfase em mulheres, jovens e pequenos produtores rurais, fundamentais para garantir a segurança alimentar em regiões carentes.
  • Parcerias com Organismos Internacionais: Fortalecimento das parcerias com FAO, IFAD, WFP e outros organismos da ONU que atuam na linha de frente contra a fome e a pobreza.

Essa proposta foi amplamente elogiada por diversos países e organismos internacionais, sendo vista como um passo essencial para enfrentar os impactos persistentes das crises alimentares e econômicas agravadas pela mudança do clima e pela desigualdade social global.

Transição Energética: O Brasil como Líder em Energias Limpas

Outro tema central na cúpula foi a transição energética, onde o Brasil se destacou como uma referência mundial na produção de energias renováveis. Com uma matriz energética já composta por mais de 80% de fontes limpas, o país reforçou seu compromisso em liderar essa transformação global, apresentando propostas concretas para uma economia de baixo carbono.

Principais Compromissos do Brasil na Transição Energética:

  • Expansão da Bioenergia: O país defendeu a ampliação do uso de biocombustíveis e do etanol, tecnologias em que o Brasil possui liderança global, como alternativas viáveis para substituir combustíveis fósseis.
  • Investimentos em Hidrogênio Verde: O Brasil anunciou planos ambiciosos para consolidar sua posição como exportador global de hidrogênio verde, com projetos de infraestrutura em parceria com países europeus e asiáticos.
  • Fortalecimento das Energias Solar e Eólica: Com o crescimento expressivo da energia solar fotovoltaica e dos parques eólicos, especialmente no Nordeste, o Brasil apresentou metas robustas para ampliar sua capacidade instalada nos próximos anos.
  • Transparência na Descarbonização: O compromisso com a redução das emissões de GEE foi reforçado, alinhando a transição energética com a política climática nacional e o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE).

A postura brasileira foi recebida positivamente, com a cúpula resultando em declarações conjuntas para aumentar os investimentos globais em energias limpas e garantir uma transição justa para países em desenvolvimento.

Fome, Pobreza e Justiça Climática: A Interconexão das Agendas

Durante a cúpula, o Brasil enfatizou a interconexão entre justiça climática, combate à fome e redução da pobreza. O discurso brasileiro defendeu que a erradicação da pobreza e a proteção ambiental não são agendas excludentes, mas sim complementares. Os países do Sul Global foram amplamente representados, trazendo para o debate questões cruciais, como:

  • Financiamento Climático Justo: Pressão para que os países desenvolvidos cumpram as promessas de aportes financeiros para ações de mitigação e adaptação climática nos países mais vulneráveis.
  • Soluções Baseadas na Natureza: A importância de proteger ecossistemas naturais, como a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal, como ativos fundamentais para o equilíbrio climático e a segurança hídrica e alimentar global.
  • Inclusão de Pequenos Produtores: Propostas para inserir agricultores familiares, comunidades tradicionais e povos indígenas nas soluções globais de produção de alimentos sustentáveis e de baixo impacto ambiental.

O Papel do Brasil no G20: Liderança e Desafios

A Cúpula do G20 no Rio de Janeiro marcou um momento crucial para o Brasil no cenário geopolítico global. O país demonstrou que está preparado para liderar soluções inovadoras e dialogar com as grandes economias em busca de um mundo mais inclusivo, sustentável e justo.

Entretanto, os desafios permanecem. A implementação das propostas, como a Aliança Global Contra a Fome, dependerá de um esforço coordenado entre países, além de garantias de financiamento e mecanismos de governança eficazes. O Brasil, ao assumir esse papel de liderança, também será cobrado pela comunidade internacional a alinhar suas políticas internas com os compromissos apresentados.

Um Novo Protagonismo Global

A Cúpula do G20 foi uma oportunidade ímpar para o Brasil demonstrar ao mundo sua capacidade de liderança em temas globais críticos. Ao colocar o combate à fome, a transição energética e a justiça climática no centro das discussões, o país reforçou sua importância no cenário internacional e pavimentou o caminho para um papel ainda mais destacado nos próximos anos.

O encontro no Rio de Janeiro não foi apenas um marco diplomático; foi também uma oportunidade para o Brasil redefinir seu protagonismo e consolidar sua imagem como um país estratégico, inovador e comprometido com o desenvolvimento sustentável em escala global.

 

6 – Eleições Municipais e a Agenda Ambiental: O Futuro das Cidades Brasileiras

As eleições municipais de 2024 trouxeram à tona uma realidade preocupante: a ausência da agenda ambiental no debate político, mesmo em um ano marcado por eventos climáticos extremos que afetaram profundamente a vida da população brasileira. Candidatos às prefeituras e câmaras municipais, em sua maioria, deixaram de lado temas críticos como gestão de resíduos sólidos, poluição urbana, saneamento básico e a adaptação às mudanças do clima, ignorando desafios essenciais para a sustentabilidade das cidades.

Essa desconexão entre o discurso político e as necessidades reais dos municípios evidencia a necessidade urgente de reorientar as prioridades políticas e colocar a agenda ambiental no centro das estratégias de governança urbana.

Os Desafios das Cidades Brasileiras Frente à Crise Climática

Com 85% da população brasileira vivendo em áreas urbanas, os municípios são os mais impactados por problemas decorrentes da mudança do clima e pela falta de planejamento urbano adequado. Em 2024, as enchentes no Sul e a seca severa em regiões como o Cerrado e a Amazônia ampliaram os problemas históricos enfrentados pelas cidades, como:

  • Infraestrutura precária que não suporta o aumento da frequência e intensidade dos eventos climáticos extremos.
  • Gestão inadequada dos resíduos sólidos, agravando problemas como enchentes e poluição de corpos d’água.
  • Falta de saneamento básico, com 45% da população brasileira ainda sem acesso à coleta de esgoto e 16% sem abastecimento regular de água tratada.
  • Poluição urbana, afetando a qualidade do ar e a saúde pública, principalmente nas grandes metrópoles.

O impacto dessas questões afeta diretamente a qualidade de vida da população, especialmente das comunidades mais vulneráveis, que são as primeiras a sentir os efeitos da degradação ambiental e da ausência de políticas públicas eficazes.

A Importância dos Municípios na Agenda Ambiental

As cidades desempenham um papel estratégico na construção de um futuro sustentável, pois são, ao mesmo tempo, grandes responsáveis pelas emissões de GEE e pela degradação ambiental, além de possuírem o potencial de implementar soluções locais eficazes. Municípios bem estruturados podem se tornar exemplos de inovação e resiliência, alinhados aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e ao Acordo de Paris. Entre as ações prioritárias que poderiam ter sido debatidas nas eleições, destacam-se:

  1. Adaptação às Mudanças Climáticas:
    • Investimentos em infraestrutura resiliente, como sistemas de drenagem urbana, pavimentação permeável e áreas verdes para conter enchentes.
    • Implementação de sistemas de alerta precoce e planos de contingência em áreas de risco.
    • Criação de políticas de uso e ocupação do solo que levem em conta as vulnerabilidades climáticas locais.
  2. Gestão Sustentável de Resíduos Sólidos:
    • Ampliação da coleta seletiva e fomento à economia circular, reduzindo o envio de resíduos para lixões e aterros.
    • Parcerias público-privadas para a implementação de usinas de reciclagem e compostagem.
    • Inclusão e valorização dos catadores de materiais recicláveis, promovendo sua formalização e garantindo renda digna.
  3. Saneamento Básico Universal:
    • Expansão do acesso à água potável e esgotamento sanitário, priorizando áreas periféricas e comunidades rurais.
    • Reabilitação de rios urbanos e mananciais como parte de estratégias integradas de abastecimento e conservação.
    • Investimentos em soluções baseadas na natureza, como recuperação de matas ciliares e implementação de jardins filtrantes.
  4. Mobilidade Urbana Sustentável:
    • Incentivo ao uso de transportes públicos limpos e eficientes, como ônibus elétricos e sistemas integrados.
    • Criação de infraestrutura para a mobilidade ativa, como ciclovias e calçadas seguras, estimulando o uso de bicicletas e caminhadas.
    • Políticas para a redução das emissões de GEE no setor de transporte, como zonas de baixa emissão em áreas urbanas.
  5. Energia Renovável e Eficiência Energética:
    • Promoção de programas de geração distribuída, como a instalação de painéis solares em edifícios públicos e residenciais.
    • Implementação de normas de eficiência energética em novas construções e retrofit de edificações antigas.

O Papel do Eleitor e da Sociedade Civil

A ausência da agenda ambiental nas eleições municipais também revela a necessidade de uma maior mobilização da sociedade civil. O eleitor tem um papel fundamental em cobrar dos candidatos compromissos reais com a sustentabilidade. A participação ativa de movimentos sociais, ONGs, setor privado e academia é essencial para:

  • Fomentar o debate público sobre temas ambientais durante as campanhas.
  • Exigir transparência e metas concretas para políticas de adaptação e mitigação.
  • Monitorar o cumprimento dos compromissos assumidos após a eleição.

Além disso, a educação ambiental deve ser fortalecida, capacitando os cidadãos para entenderem o impacto das ações locais no meio ambiente global e na qualidade de vida das cidades.

Um Chamado à Ação

As eleições municipais de 2024 evidenciaram uma lacuna preocupante: a falta de conexão entre a realidade climática do país e as propostas políticas para os municípios. Essa desconexão representa um risco para o desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida urbana, especialmente em um contexto de eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes.

O futuro das cidades brasileiras depende de uma mudança de mentalidade nas políticas públicas, em que a sustentabilidade seja tratada como prioridade e não como tema secundário. Os prefeitos e vereadores eleitos terão a responsabilidade de integrar a agenda ambiental em suas gestões, garantindo cidades mais resilientes, inclusivas e preparadas para os desafios do século XXI.

A cobrança cidadã será essencial para que as cidades brasileiras avancem em políticas que alinhem crescimento econômico, justiça social e preservação ambiental. Como afirmou a ONU em sua Agenda 2030, “as cidades são o epicentro da transformação global” – e o Brasil precisa liderar essa mudança, começando por seus municípios.

 

Conclusão: Desafios, Aprendizados e Caminhos para 2025

O ano de 2024 foi um período de intensos desafios, grandes reflexões e importantes avanços para o Brasil e o mundo na agenda da sustentabilidade. Enfrentamos eventos climáticos extremos que expuseram nossa vulnerabilidade, mas também destacaram a urgência de políticas robustas de adaptação. A aprovação histórica do mercado de carbono e o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões estabeleceram as bases para uma transição econômica justa e de baixo carbono, criando novas oportunidades para o setor produtivo, especialmente o agronegócio sustentável.

Além disso, o protagonismo brasileiro em eventos internacionais como a COP16 da Biodiversidade e a COP29 do Clima, bem como a liderança na Cúpula do G20, posicionou o país como uma referência global em temas essenciais, como combate à fome, transição energética e conservação ambiental. Contudo, as eleições municipais deixaram um alerta importante: a necessidade de integrar a agenda ambiental ao planejamento urbano e às políticas públicas locais, garantindo cidades mais resilientes e inclusivas.

Oportunidades para 2025

À medida que nos preparamos para 2025, levamos conosco aprendizados valiosos e uma visão clara do que precisa ser feito. Precisamos transformar os compromissos assumidos em ações concretas, integrando sustentabilidade às prioridades econômicas e sociais. O fortalecimento das políticas ambientais deve caminhar lado a lado com o crescimento econômico, e o Brasil tem todas as condições de liderar essa transformação.

Entre os caminhos para o próximo ano, destacam-se:

  • A implementação efetiva do mercado de carbono como um motor para inovação e sustentabilidade.
  • A recuperação de ecossistemas degradados e o combate ao desmatamento como pilares para o equilíbrio ambiental e econômico.
  • A ampliação das soluções baseadas na natureza e das práticas agrícolas de baixo carbono, como ILPF e agroflorestas.
  • O engajamento de municípios e cidades na construção de políticas locais alinhadas aos desafios globais.

Mais do que nunca, precisamos unir setores público, privado e a sociedade civil em uma jornada colaborativa e comprometida com o futuro do planeta. O Brasil, com sua riqueza ambiental, biodiversidade única e potencial econômico, tem a chance de ser a ponte entre desenvolvimento e sustentabilidade, inspirando outras nações.

Uma Mensagem para 2025

2025

Que 2025 seja o ano em que transformamos promessas em realidade. Um ano em que os desafios do presente nos inspirem a agir com responsabilidade, inovação e coragem. Que possamos construir uma economia de baixo carbono, fortalecer comunidades vulneráveis e preservar os recursos naturais que garantem o futuro das próximas gerações.

O caminho será árduo, mas os aprendizados de 2024 nos mostraram que é possível avançar. Que cada passo dado em direção à sustentabilidade nos aproxime de um futuro mais justo, resiliente e próspero para todos. Juntos, podemos transformar o Brasil em um exemplo global de equilíbrio entre produção, preservação e inclusão.

2025 nos aguarda – que este seja o ano da ação e da transformação. 🌱

 

 

 

Renato Rodrigues
Renato Rodrigues Biólogo, Doutor em Geociências e Pós Doutor em Sistemas de Gestão Sustentáveis. Atualmente é Gerente de Desenvolvimento de Mercado da Agoro Carbon, professor convidado da Fundação Dom Cabral e da Universidade Federal Fluminense e membro do UNFCCC Roster of Experts.