O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) decidiu nesta segunda-feira, 18/08, suspender, em caráter preventivo, a moratória da soja. Além da suspensão, o órgão abriu um processo administrativo contra empresas e associações que assinaram o acordo. Criada em 2008, a moratória é um compromisso privado que proíbe a compra de soja cultivada em áreas desmatadas da Amazônia Legal após aquele ano — mesmo quando o desmate é autorizado por lei.
Segundo Leonardo Munhoz, doutor em direito e pesquisador da FGV, a medida reflete a percepção de que o acordo pode ferir regras de concorrência no Brasil, ao restringir produtores que cumprem a legislação ambiental, mas não conseguem vender para grandes tradings signatárias da moratória.
Questionamentos à legalidade da moratória
Munhoz lembra que a decisão liminar do CADE se soma a outras disputas em andamento. Em 2023 e 2024, a moratória já vinha sendo contestada por produtores e entidades, que alegam que ela cria barreiras de mercado além do que estabelece o Código Florestal.
O caso também chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde uma lei estadual do Mato Grosso, que retira incentivos fiscais de empresas signatárias do acordo, foi questionada. Embora inicialmente suspensa, a lei voltou a valer após decisão do ministro Flávio Dino, que considerou legítima a prerrogativa do estado.
Impactos para produtores e mercado
A crítica central é que a moratória proíbe a comercialização de áreas desmatadas após 2008, mesmo quando o desmate tem autorização legal. Na visão de especialistas, isso ultrapassa o limite da legislação brasileira e pode prejudicar produtores que cumprem as normas ambientais, mas ficam impedidos de acessar parte do mercado.
“O CADE entende que, ao impor restrições além do Código Florestal, o acordo pode afetar a concorrência de forma indevida”, explica Munhoz.
Cenário internacional e novas regras
Apesar da suspensão, o pesquisador da FGV ressalta que não há recuo na pauta ambiental. Pelo contrário: a tendência é de atualização das regras. A Lei Europeia de Desmatamento, que passará a exigir comprovação de origem da soja livre de desmate após 2020, deve impor novas obrigações ao setor.
Assim, a decisão do CADE pode ser vista como um movimento de transição para alinhar as regras brasileiras às exigências internacionais, mas com base em instrumentos legais claros e que não comprometam a concorrência interna.
Convergência entre CADE e STF
A discussão sobre a moratória da soja une aspectos ambientais, econômicos e jurídicos. Enquanto o CADE aponta possíveis violações à concorrência, o STF analisa se a retirada de incentivos fiscais para empresas signatárias fere o princípio da proteção ambiental.
Segundo Munhoz, “o que vemos não é a negação da preservação ambiental, mas um debate sobre como equilibrar as regras nacionais com acordos privados e normas internacionais”.