Ferramenta biotecnológica agiliza lançamento de novas cultivares de café
A técnica de predição genômica permite a identificação de materiais que possuem em seu DNA genes favoráveis à expressão de características de interesse da cadeia produtiva.
A aplicação da técnica de seleção genômica ampla (genome-wide selection, ou GWS, na sigla em inglês) permite que o melhoramento genético do cafeeiro se torne mais ágil e eficaz. Essa foi uma das conclusões do documento Aceleração do melhoramento do cafeeiro via seleção genômica: agilidade e eficácia no lançamento de novas cultivares, fruto do trabalho de pesquisadores da Embrapa Café (DF), da Universidade Federal de Viçosa (UFV), da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM), do Instituto Federal do Triângulo Mineiro (IFTM) e da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig).
Com a técnica de predição genômica, é possível identificar materiais que possuem em seu DNA genes favoráveis à expressão de certas características de interesse da cadeia produtiva, utilizando marcadores moleculares. Desse modo, a presença de determinados marcadores é capaz de indicar que a planta possui uma característica a eles relacionada, como, por exemplo, resistência a determinada doença, boa produtividade etc.
A GWS permite predizer o comportamento dos indivíduos precocemente, o que, sem a ferramenta, só seria possível na idade adulta. Isso é especialmente importante para o melhoramento de organismos perenes, que geralmente levam muito tempo para atingir a idade adulta ou a fase de produção. É o caso de animais, espécies florestais, fruteiras, cana-de-açúcar e o café. O valor genético genômico é a previsão das características fenotípicas que um indivíduo terá e que é estimado pelos milhares de marcadores moleculares distribuídos no genoma. “Esses marcadores podem ser analisados em qualquer estágio de desenvolvimento da planta, inclusive quando ela é jovem (muda). Seria uma predição de como o indivíduo se comportará em termos das características de interesse agronômico”, detalha a pesquisadora da Embrapa Eveline Caixeta, que coordenou a pesquisa que avaliou a eficiência da GWS na predição de caracteres produtivos, agronômicos e de resistência a doenças e pragas do cafeeiro. O trabalho também analisou a eficiência da técnica para predizer o valor genético genômico (GEBV) de populações dessas plantas em melhoramento.
“Nosso objetivo com a publicação é demonstrar como uma das ferramentas biotecnológicas disponíveis pode auxiliar os programas de melhoramento genético do cafeeiro e, assim, acelerar a obtenção de cultivares melhoradas”, declara Caixeta. Segundo a pesquisadora, os estudos de seleção genômica em cafeeiro são ainda incipientes e as informações nessa área são importantes para subsidiar ações de melhoramento da cultura. Estudos na área também ajudam a conferir maior sustentabilidade ao sistema produtivo da cadeia do café, de acordo com a cientista.
Os estudos registraram que a GWS contribuiu para o melhoramento tanto do café arábica quanto do canéfora, ao possibilitar a redução no tempo necessário para completar o ciclo de seleção fenotípica. “Obtivemos resultados semelhantes para as duas espécies e para as principais características agronômicas de cada uma delas. De acordo com os trabalhos iniciais que fizemos, estimamos uma redução de metade do tempo de seleção para ambos”, relata.
Programas de melhoramento
São realizados trabalhos de seleção genética no Brasil desde 1932. Eles trouxeram grande impacto ao desenvolvimento de cultivares com diferentes características agronômicas de interesse da cafeicultura. O melhoramento genético permitiu a adaptação do cafeeiro a diferentes regiões do País; atribuiu maior produtividade, estabilidade e precocidade, e resistência à ferrugem do cafeeiro, a principal doença da cultura. Características como tolerância à seca e à geada, arquitetura adequada para adensamento; porte baixo e formato de copa adequado para colheita mecanizada; e elevado tamanho de grão e qualidade de bebida também têm sido alvos dos pesquisadores ao longo dos anos.
Os programas de melhoramento genético de plantas resultam em fortes impactos na produção agrícola, conforme analisa o chefe-geral da Embrapa Café, Antônio Fernando Guerra. “Inicialmente, o melhoramento genético vegetal se baseava exclusivamente nas características morfoagronômicas para selecionar indivíduos nas populações segregantes”, ou seja, aquelas que associam média alta e suficiente variabilidade genética que possibilite a seleção de linhagens com desempenho superior aos pais. Eram realizados vários cruzamentos e iam sendo selecionadas as plantas com melhor desempenho do ponto de vista agronômico, o que podia levar mais de dez anos para colher os resultados esperados.
Guerra explica que, há cerca de 40 anos, marcadores moleculares foram desenvolvidos e passaram a ser utilizados como ferramenta auxiliar às informações fenotípicas, permitindo avanços significativos em diversos programas de melhoramento.
Ele conta que os programas de melhoramento estão incorporando novas tecnologias. As abordagens mais comumente usadas são a seleção assistida por marcadores moleculares (SAM) e a seleção genômica ampla (GWS). “Em plantas perenes, de ciclos longos, como o cafeeiro, a aplicabilidade da seleção genômica ampla assume importância acentuada. Essa estratégia permite aumentar os ganhos genéticos, para vários caracteres agronômicos, por unidade de tempo, o que possibilita reduzir o tempo de lançamento de cultivares de cafés”, afirma o chefe-geral.
Apesar de a maioria dos programas de melhoramento brasileiros ter foco principal no desenvolvimento de cultivares de C. arabica, a crescente importância da espécie C. canephora (café canéfora) tem levado ao interesse em também obter cultivares dessa espécie. O cultivo comercial do café canéfora no Brasil foi impulsionado a partir dos anos 1950, com o advento dos cafés solúveis e, posteriormente, com o seu uso no grão torrado e moído, em misturas (blend) com o arábica. Esse aumento na demanda por C. canephora estimulou a produção brasileira e, consequentemente, a expansão do parque cafeeiro nacional e o desenvolvimento de novas cultivares.
“O processo de melhoramento genético é um trabalho de longo prazo e, muitas vezes, quando se desenvolve uma cultivar, outros problemas aparecem, fazendo com que se estabeleça um constante desafio aos melhoristas de sempre buscar novas cultivares”, afirma Eveline Caixeta. Esse cenário impulsiona a necessidade de se adicionar novas tecnologias capazes de incrementar a dinâmica e a capacidade de resposta dos programas de melhoramento.
A pesquisadora diz, ainda, que o potencial da biotecnologia no melhoramento está não só na redução do tempo de condução do programa, mas também na base científica sólida que pode explicar a genética e a bioquímica das mudanças que ocorreram ou que poderão ocorrer no processo de melhoramento genético. Ou seja, ela permite conhecer com mais detalhes e precisão a genética da planta e as predições de suas características.
Fonte: Embrapa