
O Brasil registrou um marco histórico na pecuária: nasceram os primeiros bezerros geneticamente editados da América Latina. O anúncio foi feito pela Embrapa Gado de Leite, em parceria com a Associação Brasileira de Angus, e representa um passo importante rumo à criação de bovinos mais resistentes ao calor e adaptados ao clima tropical.
A inovação consiste na introdução de uma mutação natural no gene do receptor da prolactina, associada ao crescimento de pelos curtos e lisos, favorecendo a termorregulação dos animais. Essa mutação já é encontrada em raças bovinas do Caribe e da América Latina, e agora foi incorporada ao genoma de embriões Angus fecundados in vitro.
Tecnologia para o futuro da pecuária tropical
De acordo com o pesquisador Luiz Sérgio de Almeida Camargo, da Embrapa Gado de Leite, o principal objetivo é adaptar uma raça originalmente europeia, como a Angus, ao calor intenso das regiões tropicais e subtropicais do Brasil.
“Esses animais de pelo curto conseguem controlar melhor a temperatura corporal, o que contribui para maior bem-estar, fertilidade e produtividade”, explica o pesquisador.
Os dois bezerros editados nasceram entre o fim de março e o início de abril e já apresentam os traços fenotípicos esperados, como o pelo curto e liso, o que comprova o sucesso da modificação genética. A comparação com bezerros não editados (usados como controle) é parte essencial do estudo.
Pesquisa acompanha desenvolvimento dos animais
Atualmente, os animais têm cerca de dois meses de vida e estão sob acompanhamento técnico da Embrapa. Segundo Camargo, não foi observada até agora nenhuma diferença comportamental ou de saúde entre os bezerros editados e os não editados.
A próxima etapa da pesquisa será verificar se a mutação pode ser transmitida aos descendentes, o que tornaria possível disseminar a característica de resistência ao calor na raça Angus por meio da reprodução convencional.
“Vamos coletar sêmen e óvulos desses animais na puberdade para gerar novos embriões e avaliar a hereditariedade da edição”, detalha o pesquisador.
Impacto direto na sustentabilidade da carne brasileira
Com o avanço das temperaturas em diversas regiões, especialmente nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do país, animais europeus enfrentam estresse térmico, o que compromete o desempenho produtivo. A edição genética pode ser uma aliada para tornar a pecuária mais eficiente, resiliente e sustentável.
A introdução de características de adaptação climática por meio de edição genômica também dialoga com a urgência de mitigar os efeitos das mudanças climáticas sobre a produção de alimentos.
Potencial para multiplicação genética
A expectativa da Embrapa é que, se os testes confirmarem a estabilidade genética e a eficácia da herança da mutação, será possível multiplicar os animais geneticamente editados e promover a adoção dessa biotecnologia por produtores de carne de alta qualidade, como a raça Angus.
Esse avanço biotecnológico abre caminho para uma nova geração de bovinos adaptados ao trópico, mantendo o padrão de qualidade da carne, reduzindo perdas e aumentando a eficiência produtiva no campo.