IPCC e a Luta Contra as Mudanças Climáticas: O Papel Essencial da Ciência e do AR6

A mudança do clima é um dos maiores desafios globais, e o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) desempenha um papel essencial na compreensão e divulgação das evidências científicas sobre o tema. Neste artigo, exploramos a estrutura e a importância do IPCC, seus grupos de trabalho e a evolução dos relatórios de avaliação, com destaque para o AR6, que traz alertas urgentes sobre o aquecimento global e eventos climáticos extremos. Também discutimos o papel do Brasil na pesquisa climática, especialmente no setor agropecuário, e as iniciativas para mitigar e adaptar-se aos impactos das mudanças climáticas. Confira o artigo completo e entenda como essas questões impactam o futuro da nossa agricultura.

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Introdução:

A mudança do clima é um dos temas mais urgentes e debatidos na atualidade, e o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) desempenha um papel central na compreensão e divulgação das evidências científicas sobre o assunto. Criado em 1988 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e pela Organização Mundial de Meteorologia (OMM), o IPCC tem como objetivo fornecer aos governos e ao público em geral uma avaliação científica clara sobre as mudanças climáticas, seus impactos e possíveis estratégias de mitigação e adaptação.

Neste artigo, exploraremos a estrutura e o funcionamento do IPCC, os grupos de trabalho que o compõem, e como seus relatórios de avaliação (ARs) têm evoluído ao longo dos anos, com foco especial no Sexto Relatório de Avaliação (AR6), que reafirma a responsabilidade humana no aquecimento global e destaca as mudanças rápidas e generalizadas que o planeta já está enfrentando. Além disso, vamos abordar o panorama da pesquisa em mudança do clima no Brasil, com um foco especial no setor agropecuário.

  1. O que é o IPCC?

Ipcc

O IPCC (www.ippcc.ch) é uma organização internacional que avalia as pesquisas científicas sobre mudanças climáticas. Diferente de outros órgãos, o IPCC não realiza pesquisas próprias; em vez disso, revisa e sintetiza os estudos existentes realizados por cientistas ao redor do mundo. Sua missão é fornecer uma visão científica equilibrada e rigorosa que ajude na formulação de políticas públicas sobre o clima. Os relatórios do IPCC são baseados no trabalho voluntário de milhares de cientistas de diversas disciplinas e países, e são amplamente considerados a referência principal sobre o estado do conhecimento científico sobre mudanças climáticas.

  1. Estrutura e Grupos de Trabalho do IPCC

O IPCC está organizado em três Grupos de Trabalho (WG) principais, cada um focado em uma área específica da mudança do clima:

WG I: Foca nas bases físicas da mudança do clima. Este grupo avalia a ciência do sistema climático e as mudanças climáticas observadas, incluindo a temperatura, precipitação, e eventos extremos.

WG II: Trata dos impactos, adaptação e vulnerabilidade. Avalia os efeitos das mudanças climáticas em ecossistemas, biodiversidade, economia, e na saúde humana, bem como as possibilidades de adaptação a essas mudanças.

WG III: Foca na mitigação da mudança do clima. Este grupo examina as opções para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, analisando políticas, tecnologias e práticas em diversos setores.

Além dos grupos de trabalho, o IPCC também possui uma Força-Tarefa sobre Inventários Nacionais de Gases de Efeito Estufa, que desenvolve diretrizes metodológicas para os países medirem e reportarem suas emissões de gases de efeito estufa.

  1. A Evolução dos Relatórios de Avaliação (ARs)

Os Relatórios de Avaliação do IPCC são publicados em intervalos de cerca de seis a sete anos e refletem o avanço da ciência do clima. A seguir, um resumo da evolução dos principais ARs:

  • Primeiro Relatório de Avaliação (AR1, 1990): Este relatório confirmou que o clima estava mudando e sugeriu que as emissões humanas de gases de efeito estufa eram um fator significativo. Embora não fosse conclusivo sobre o quanto da mudança era atribuível às atividades humanas, o AR1 forneceu a base científica que levou à criação da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC).
  • Segundo Relatório de Avaliação (AR2, 1995): Este relatório foi o primeiro a afirmar com mais confiança que “o balanço das evidências sugere que há uma influência humana discernível no clima global”. Esta avaliação ajudou a moldar o Protocolo de Quioto, o primeiro tratado internacional a estabelecer metas obrigatórias de redução de emissões para países desenvolvidos.
  • Terceiro Relatório de Avaliação (AR3, 2001): O AR3 introduziu o conceito de “cenários de emissões”, destacando as trajetórias potenciais de futuras emissões de gases de efeito estufa e seus impactos. Ele também forneceu uma visão mais detalhada sobre os riscos das mudanças climáticas, como o aumento do nível do mar e a perda de biodiversidade.
  • Quarto Relatório de Avaliação (AR4, 2007): O AR4 consolidou a evidência de que “o aquecimento do sistema climático é inequívoco” e que é muito provável que a maior parte do aumento na temperatura global desde meados do século 20 se deva ao aumento das concentrações de gases de efeito estufa de origem humana. Este relatório foi fundamental para a concessão do Prêmio Nobel da Paz ao IPCC em 2007, compartilhado com Al Gore.
  • Quinto Relatório de Avaliação (AR5, 2014): Este relatório reforçou ainda mais a certeza sobre a influência humana nas mudanças climáticas, afirmando que “a influência humana no sistema climático é clara, e é extremamente provável que mais da metade do aumento observado na temperatura média global desde 1951 seja causado pelas atividades humanas”. O AR5 também explorou em detalhes as opções de mitigação e adaptação.
  • Sexto Relatório de Avaliação (AR6, 2021-2022): O AR6 traz uma avaliação ainda mais abrangente e detalhada das mudanças climáticas. Ele declara com ênfase que é “inequívoco” que a atividade humana está aquecendo a atmosfera, o oceano e a terra, resultando em mudanças rápidas e generalizadas na atmosfera, na criosfera e na biosfera. O AR6 também destaca os impactos já observados, como o aumento da frequência e intensidade de eventos climáticos extremos, e as projeções de que, sem uma ação imediata e robusta, as metas do Acordo de Paris serão inatingíveis.
  1. Os Principais Resultados do AR6

O AR6 é, até o momento, a avaliação mais completa e rigorosa sobre o estado das mudanças climáticas e suas consequências. Alguns dos principais resultados incluem:

Aquecimento Global: A temperatura média global já aumentou cerca de 1,1°C em relação aos níveis pré-industriais, e está a caminho de ultrapassar 1,5°C nas próximas duas décadas se não houver uma redução drástica nas emissões.

Eventos Extremos: O AR6 reforça que eventos climáticos extremos, como ondas de calor, enchentes e secas, estão se tornando mais frequentes e intensos devido às mudanças climáticas.

Impactos Regionais: O relatório detalha como diferentes regiões do mundo são afetadas de maneira desigual pelas mudanças climáticas, com os países em desenvolvimento enfrentando os impactos mais severos, apesar de terem contribuído menos para o problema.

Urgência da Ação: O AR6 destaca a necessidade urgente de uma ação global coordenada para limitar o aquecimento a 1,5°C, o que requer reduções imediatas, rápidas e em larga escala nas emissões de gases de efeito estufa.

 

  1. IPCC Emission Factor Database:

Dentro do contexto dos inventários nacionais de gases de efeito estufa, o IPCC mantém uma ferramenta crucial chamada Emission Factor Database (EFDB). Esta base de dados é essencial para que os países desenvolvam seus inventários nacionais de emissões, oferecendo uma ampla gama de fatores de emissão baseados em diferentes atividades econômicas e práticas agrícolas, industriais, de transporte, entre outras.

) EFDB é um banco de dados global que fornece valores de fatores de emissão usados para calcular as emissões de gases de efeito estufa a partir de dados de atividade. Esses fatores são vitais para garantir que os inventários nacionais sejam precisos e consistentes. Por exemplo, um país pode usar um fator de emissão específico da EFDB para calcular as emissões de metano resultantes de práticas de cultivo de arroz, ou de dióxido de carbono proveniente da queima de carvão em usinas termelétricas.

A importância da EFDB está na padronização que ela traz para o processo de elaboração dos inventários nacionais. Com fatores de emissão uniformizados, os países podem comparar suas emissões de maneira consistente e confiável, o que é crucial para o monitoramento do progresso em relação às metas de redução de emissões estabelecidas internacionalmente, como as do Acordo de Paris. Além disso, a EFDB é continuamente atualizada com novos dados e revisões, garantindo que os fatores de emissão reflitam as melhores práticas e o conhecimento científico mais recente.

  1. A Pesquisa em Mudança do Clima no Brasil: Foco no Setor Agropecuário

O Brasil, devido à sua vasta extensão territorial e diversidade de ecossistemas, tem um papel crucial na pesquisa sobre mudanças climáticas, especialmente no setor agropecuário. Este setor, que é vital para a economia brasileira, enfrenta desafios significativos em um cenário de mudanças climáticas, como a variabilidade climática, o aumento de eventos extremos e a necessidade de manter a produtividade agrícola enquanto se reduz as emissões de gases de efeito estufa.

Rede Clima e o Papel das Universidades e Instituições de Pesquisa:

No Brasil, a Rede Brasileira de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (Rede Clima), criada em 2007, é uma iniciativa importante que reúne pesquisadores de diversas instituições para estudar os impactos das mudanças climáticas no país. A Rede Clima trabalha em colaboração com várias universidades e centros de pesquisa, como a Embrapa, que desempenha um papel essencial na pesquisa agropecuária e na promoção de práticas sustentáveis.

A Embrapa tem liderado pesquisas sobre o impacto das mudanças climáticas na agricultura, desenvolvendo tecnologias e práticas para mitigar os efeitos das mudanças climáticas e adaptar a produção agrícola a essas novas condições. Entre as iniciativas destacam-se o Plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono), que promove práticas como o plantio direto, a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e a recuperação de pastagens degradadas.

Impactos no Setor Agropecuário:

As mudanças climáticas representam uma ameaça significativa para o setor agropecuário no Brasil, com impactos potenciais na produtividade, qualidade do solo, disponibilidade de água e na ocorrência de pragas e doenças. A pesquisa científica no Brasil tem focado em entender como essas mudanças afetam as diferentes regiões do país e em desenvolver estratégias de adaptação que permitam a continuidade da produção agrícola com o mínimo de impacto ambiental.

Conclusão:

O IPCC tem sido fundamental para aumentar a compreensão global sobre as mudanças climáticas e orientar as políticas de mitigação e adaptação. No Brasil, a pesquisa sobre mudança do clima, especialmente no setor agropecuário, é essencial para garantir a sustentabilidade e a resiliência da agricultura frente a esses desafios. O AR6, em particular, representa um chamado urgente à ação, mostrando que a janela para evitar as piores consequências das mudanças climáticas está se fech…ando rapidamente. É imperativo que governos, empresas e a sociedade civil se unam para implementar as recomendações científicas e garantir um futuro sustentável para todos.

A pesquisa em mudança do clima no Brasil, especialmente no setor agropecuário, desempenha um papel crucial na adaptação e mitigação dos impactos climáticos. O país, sendo uma das maiores potências agrícolas do mundo, enfrenta desafios significativos, como a variabilidade climática e o aumento de eventos extremos que afetam diretamente a produção agrícola. A Rede Clima, em conjunto com universidades e instituições de pesquisa como a Embrapa, lidera os esforços para desenvolver práticas agrícolas sustentáveis que não apenas mantenham a produtividade, mas também reduzam as emissões de gases de efeito estufa.

O Plano ABC (Agricultura de Baixo Carbono) é um exemplo notável dessas iniciativas, promovendo tecnologias como o plantio direto, a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e a recuperação de pastagens degradadas. Essas práticas não só contribuem para a mitigação das mudanças climáticas, mas também para a adaptação do setor agropecuário às novas realidades climáticas.

Em conclusão, enquanto o IPCC fornece uma visão global e científica sobre as mudanças climáticas, o Brasil precisa continuar a investir em pesquisa e desenvolvimento para adaptar suas práticas agrícolas e mitigar os impactos climáticos. A colaboração entre o governo, o setor privado e a comunidade científica será essencial para garantir a segurança alimentar e a sustentabilidade ambiental em um futuro onde as mudanças climáticas serão uma realidade cada vez mais presente.

Enquanto o IPCC e a comunidade científica continuam a alertar sobre a urgência de mitigar os impactos das mudanças climáticas, é igualmente crucial que exploremos as estratégias de adaptação. O Brasil, como uma das maiores potências agrícolas do mundo, precisa estar preparado para enfrentar os desafios que as mudanças climáticas já estão impondo e que ainda estão por vir. No próximo artigo da série “Palavra de Especialista”, vamos aprofundar a discussão sobre “Adaptação à Mudança do Clima”, explorando as melhores práticas e políticas que podem ajudar o setor agropecuário e outras áreas a se adaptarem a um clima em transformação. Fique ligado e acompanhe como podemos juntos construir um futuro mais resiliente e sustentável!

Para mais conteúdo sobre o tema, acesse: https://planetacampo.canalrural.com.br/colunistas/

Renato Rodrigues
Renato Rodrigues Biólogo, Doutor em Geociências e Pós Doutor em Sistemas de Gestão Sustentáveis. Atualmente é Gerente de Desenvolvimento de Mercado da Agoro Carbon, professor convidado da Fundação Dom Cabral e da Universidade Federal Fluminense e membro do UNFCCC Roster of Experts.