
Com o mercado internacional do café aquecido, produtores brasileiros têm buscado alternativas para manter a produtividade e controlar os custos em um cenário cada vez mais desafiador, marcado por mudanças climáticas e preços elevados de insumos agrícolas. Uma solução vem ganhando destaque nas lavouras: o biochar, um tipo de carvão vegetal com propriedades únicas que ajudam a reter água, nutrientes e a reduzir o uso de fertilizantes.
O produto tem atraído a atenção principalmente entre cafeicultores de Minas Gerais e Espírito Santo, que já estão colhendo os primeiros resultados após a aplicação da tecnologia. Segundo Pedro de Figueiredo, CEO da NetZero no Brasil, o biochar funciona como uma esponja de carbono no solo, favorecendo o crescimento das plantas e contribuindo para a sustentabilidade das lavouras.
“Os primeiros dados mostram aumento de até 45% na produtividade do café, com média de 25% em muitas propriedades”, afirma Figueiredo. Além disso, o uso do biochar evita a queima de resíduos agrícolas como a palha, processo que normalmente libera CO₂ e metano na atmosfera, transformando esse material em um recurso valioso.
A tecnologia, que tem origem milenar na chamada “Terra Preta de Índio”, encontrada na região amazônica, foi estudada por cientistas do mundo inteiro e hoje ganha escala industrial com apoio de modelos econômicos baseados em créditos de carbono.
Do conhecimento indígena à inovação tecnológica
O biochar não é uma invenção recente. Sua origem remonta às práticas dos povos indígenas da Amazônia, que há séculos enriqueciam o solo com carvão vegetal, criando as chamadas Terras Pretas — altamente férteis e estáveis ao longo do tempo. O segredo por trás dessa fertilidade é justamente a presença do biochar, que mantém nutrientes no solo por milhares de anos.
Diferente do carvão comum, o biochar é tratado de forma a preservar sua estrutura porosa, o que permite absorver e reter água e nutrientes. Essa capacidade transforma o solo em um ambiente mais equilibrado para o desenvolvimento das plantas, reduzindo inclusive a necessidade de irrigação em períodos de estiagem.
Com a evolução tecnológica e a crescente demanda por soluções sustentáveis, o biochá ganhou reconhecimento internacional como uma ferramenta eficaz no sequestro de carbono — processo pelo qual o carbono é capturado da atmosfera e armazenado no solo, ajudando a combater o aquecimento global.
A viabilidade econômica, porém, sempre foi um obstáculo para a adoção em larga escala. Isso começou a mudar a partir de 2018, com iniciativas europeias que passaram a subsidiar o uso do biochar por meio da venda de créditos de carbono. Uma dessas iniciativas foi liderada pela família Renault, na França, que estruturou um modelo de negócios capaz de tornar o uso do biochar financeiramente viável.
Brasil no mapa da agricultura regenerativa
Foi a partir desse modelo que nasceu a NetZero no Brasil, em janeiro de 2021, com o objetivo de produzir e distribuir o insumo em escala industrial. A empresa atua hoje em várias regiões cafeeiras do país, com destaque para a cidade de Lajinha, em Minas Gerais, e municípios do Espírito Santo.
“Começamos nossos projetos na África, também com café, e, por eu ser mineiro, foi natural trazer essa tecnologia para a nossa terra”, conta Pedro. Além das unidades já em operação, outras três plantas estão em construção, ampliando a capacidade de produção e distribuição do biochar.
O impacto tem sido direto na lavoura. Segundo relatos dos próprios produtores, a aplicação do biochar contribui para o vigor das plantas, melhora a estrutura do solo e reduz os gastos com insumos químicos. A tecnologia também facilita práticas de agricultura regenerativa, um modelo que busca não apenas manter, mas recuperar a saúde do solo e do ecossistema agrícola.
Além de benefícios agronômicos, a produção do biochar contribui para a economia circular, ao transformar resíduos agrícolas em insumo de alto valor. A palha que antes seria queimada passa a ser reaproveitada, gerando menor emissão de gases de efeito estufa e maior eficiência produtiva.
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